Inicialmente, é importante lembrar que nem todo
usuário de drogas (lícitas ou ilícitas) vai se tornar em dependente químico.
Entretanto, todo dependente químico um dia foi usuário. Geralmente, o caminho
percorrido para que uma pessoa passe de simples usuário para dependente químico,
acontece assim: ele inicia o uso de uma substância psicoativa de forma
experimental. Esta primeira experiência pode ter sido promovida por curiosidade,
desejo de sentir novas emoções ou por pressão de grupo. A partir de então, ela pode
passar a fazer o uso esporádico, isto é, em locais e circunstâncias favoráveis
para a utilização da droga. O usuário ainda cumpre (“funciona”) com seus compromissos
familiares, profissionais e sociais.
Sua relação com a droga passa a ter progressividade, usando-a
de maneira habitual e frequente. Nesta etapa, é possível observar mudanças
comportamentais. Dito em outras palavras, há sinais de ruptura em seus relacionamentos
sociais.
No prolongar desse relacionamento, ele passa a ter um
envolvimento maior e continuo com a droga, deixando de ser usuário (aquele que
detinha o controle sobre o desejo de usar a substância), chegando ao ponto de
se tornar dependente químico (pessoa que já perdeu todo o controle sobre seus
comportamentos). Neste estágio, ele já vive pela e para a droga. É conhecido
como toxicômano ou fármaco-dependente. Como consequência, rompe com os vínculos
afetivos, profissionais e sociais. E, ainda, pode vir a sofrer de decadência
física e moral.
Luiz Flávio Gomes (2006) escreveu sobre a importância
desta distinção: “É preciso distinguir, prontamente, o usuário do dependente de
drogas (...). A distinção é muito importante para o efeito de se descobrir qual
a medida penal será mais adequada a ser aplicada em cada caso concreto”.
O projeto de lei apresentado pelo Senador Antônio
Carlos Valadares (PSB-SE), sugere que “se uma pessoa for detida com droga
ilícita em quantidade suficiente para o uso por até cinco dias, não pode ser
presa como traficante (...)”. O nobre senador teve como base uma pesquisa feita
pela Fiocruz, destacando uma droga específica, o crack; delimitando em 16
pedras como padrão de consumo diário (...), ou seja, 80 pedras pelo período de
cinco dias.
Pela forma que foi colocado no projeto, deixa transparecer
que estão querendo avaliar a distinção entre as figuras delitivas do usuário e
traficante, usando como marco distintivo apenas a variante da “quantidade” de
drogas em posse do individuo.
Ressalta-se, que cada pessoa pode reagir de forma
diferente, usando a mesma droga e na mesma dosagem. Ademais, o usuário e o
dependente têm suas particularidades em seu relacionamento de consumo diário
com as drogas.
A Lei Federal nº. 11.343, em vigor no Brasil desde
2006, em seus artigos 28 e 33, apresenta distinção clara sobre o usuário e o
traficante de drogas: art. 28. Quem
adquirir, (...), transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com
determinação legal (...), será submetido às seguintes penas: I – advertência
sobre os efeitos das drogas; II – prestação de serviços à comunidade; III –
medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.
A dependência química não está restrita ou limitada somente
pela quantidade de drogas usadas diariamente; outros fatores contribuem para
seu desenvolvimento: o tipo de substância, a forma de utilização; a
sensibilidade de cada usuário (e o metabolismo); a frequência do uso; a dosagem
na administração da droga; a expectativa esperada sobre seus efeitos e a
associação com outras drogas (dependência cruzada); entre outros.
O juiz de
direito, ao analisar o auto de prisão em flagrante delito, terá outras
variantes para determinar se a droga era para consumo próprio (usuário) ou para
o comércio ilegal (tráfico), de acordo com o § 2º, do art. 28 da Lei: “Para
determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal (ou tráfico), o juiz
atenderá quanto à natureza e à
quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se
desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e
aos antecedentes do agente”. (grifo nosso)
Na verdade, o que estamos precisamos
é que se fiscalizem o cumprimento da Lei, pois, no mesmo art. 28, em seu § 7º,
diz que: “O juiz determinará ao Poder
Público que coloque à disposição do infrator, gratuitamente, estabelecimento de
saúde, preferencialmente ambulatorial, para tratamento especializado”.
Nota-se que está sendo contemplada por este dispositivo legal, a pessoa do
usuário e, em especial, o dependente químico.
Quanto a pessoa do traficante de
drogas, a legislação penal ficou mais rigorosa, destacando-se em ser art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar,
produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito,
transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo
ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo
com determinação legal ou regulamentar: Pena
- reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a
1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.
Que nos perdoe o relator deste
Projeto de lei (e aqueles que o aprovaram), mas em nossa humilde interpretação,
não haveria necessidade de se perder tempo com algo que já está bem cristalino
em nosso Diploma Penal. Como já disse alguém: “Toda lei é boa, basta saber quem
vai interpretá-la”.
EDUARDO VERONESE DA SILVA
Educador Físico
Bacharel em Direito
Especialista em
Direito Militar
Email:
proerdveronese@gmail.com
Penso, que nossos representantes públicos e políticos, poderiam estar mais preocupados com a saúde física e mental (e, por que não dizer, financeira) do povo, principalmente aos de baixo poder aquisitivo. Elaborando Projetos de Lei que venha a melhorar sua qualidade de vida, assegurando-lhes dignidade e respeito, pois são seres humanos.Neste ponto, poderiam pensar em ampliar, promover qualificações de mais profissionais da área da saúde mental, para estar sendo alocados em clínicas ou postos de saúdes, para atender aqueles que apresentam sinalizadores da doença chamada dependência química.
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