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segunda-feira, 17 de outubro de 2016

1ª PARTE: SEGURANÇA E ADVERTÊNCIAS DO EVANGELHO: RECUPERANDO O EVANGELHO

WASHER, Paul. Segurança e Advertências do Evangelho. São Paulo: Fiel, 2015.

Prefácio
            Como é de conhecimento comum, a palavra evangelho vem do vocábulo grego euangélion corretamente traduzido como “Boas Novas”. Em certo sentido, toda pagina da Escritura contém o evangelho, mas em outro sentido, evangelho se refere a uma mensagem muito específica – a salvação realizada para um povo caído mediante a vida, morte, ressurreição e ascensão de Jesus Cristo, Filho de Deus.
            Conforme o bom prazer do Pai, o Filho eterno, igual ao Pai, e representação exata da natureza divina, voluntariamente deixou a glória do céu, foi concebido pelo Espírito Santo no ventre de uma virgem (Maria), e nasceu Deus-homem; Jesus de Nazaré[1]. Como homem, andou sobre a terra em perfeita obediência à Lei de Deus. Na plenitude dos tempos, os homens o rejeitaram e crucificaram. Sobre a cruz, Jesus Cristo carregou o pecado do homem, sofreu a ira de Deus e morreu no lugar do homem (1 Pedro 2:24; Isaías 53:10).
            A sua ressurreição ao terceiro dia, é a declaração divina de que o Pai aceitou a morte de seu Filho como sacrifício pelo pecado do homem. Ele pagou a penalidade pela desobediência do homem, satisfez as exigências da justiça e aplacou a ira de Deus (Lucas 24:6; Romanos 1:4).
Estando assentado à mão direita do Pai, nos céus, isto é, na presença de Deus, Jesus representa o seu povo e intercede a seu favor junto a Deus. Todos aqueles que reconhecem seu estado pessoal de incapacidade e pecado, e se lançam sobre a pessoa de Cristo, são perdoados completamente, declarados justos, e reconciliados com Deus[2]. Este é o evangelho de Deus e de Jesus Cristo, seu Filho.
Um dos maiores crimes cometidos pela recente geração cristã é a negligência do evangelho, e é desta negligência que surgem todos os outros males. Porque muitos dos que proclamam o evangelho são ignorantes (não detém conhecimento) das suas verdades basilares, que são o cerne do evangelho – a justiça de Deus; a total depravação do homem; a expiação pelo sangue; a natureza da verdadeira conversão e a base Bíblica para a segurança da salvação, estão demasiadamente ausentes dos púlpitos (p.10-11).
Está havendo um reducionismo evangélico, ensinando que a conversão é mera decisão humana e pronunciando a segurança da salvação sobre qualquer pessoa que faça a oração do pecador. Com esta mensagem reduzida, ocorrem resultados drásticos, tais como:
Primeiro, maior endurecimento do coração dos não convertidos. Milhões de pessoas não transformadas pelo verdadeiro evangelho de Jesus Cristo andam pelas ruas e se assentam nos bancos da igreja, estando convencidos de sua salvação por terem levantado suas mãos numa campanha evangelística ou por repetirem uma oração.
Segundo, esse evangelho deforma a igreja, transformando-a de um corpo espiritual de cristãos regenerados para um ajuntamento de homens carnais que professam conhecer a Deus, mas O negam por suas obras e ações (Tito 1:16).
Terceiro, um evangelho desse tipo reduz o evangelismo e missões a pouco mais que um esforço humanista, impulsionado por hábeis estratégias de mercado baseados em estudo cuidadoso das últimas tendências da cultura. Existe hoje maior ênfase em compreender nossa cultura caída, bem como seus modismos, do que em compreender e proclamar a única mensagem que tem o poder de salvá-la. Esquecemo-nos de que o verdadeiro evangelho é e sempre será relevante a cada cultura, porque é a Palavra eterna de Deus a todo e qualquer homem (p.12).
Quarto, esse evangelho traz vergonha ao nome de Deus. Por ele, os carnais e não convertidos entram na comunhão da igreja, e pela quase total negligência da disciplina Bíblica, é-lhes permitido permanecer sem que sejam corrigidos ou repreendidos. Isso macula a pureza e reputação da igreja, blasfemando o nome de Deus entre os incrédulos (Romanos 2:24). Sendo assim, o nosso Deus não é glorificado, nem a igreja é edificada, o membro não convertido não é salvo e a igreja tem pouco ou nenhum testemunho ao mundo descrente.
Como mordomos de Deus, não nos cabe ficarmos de braços cruzados e nada fazermos, pois temos o dever de recuperar o único evangelho verdadeiro e proclamá-lo com ousadia e clareza a todos. Faremos bem em entender as palavras ditas por Charles Haddon Spurgeon sobre esse assunto:

Nesses dias, sinto-me obrigado a passar repetidamente pelas verdades elementares do evangelho. Em tempos de paz, podemos sentir liberdade para fazer excursões aos distritos interessantes da verdade que estão em campos mais longes; mas agora é necessário que fiquemos em casa, guardando os corações e lares da igreja ao defender os primeiros princípios da fé. Nesta era, homens que dizem coisas pervertidas têm surgido na própria igreja. Pode ser que haja muitos que nos perturbem com suas filosofias e interpretações novas, pelas quais negam as doutrinas que professam ensinos, e minam a fé que prometeram guardar. Faz bem que alguns de nós, que conhecemos aquilo que cremos, e não temos significados secretos para nossas palavras, firmemos  o pé e mantenhamos nossa posição, proclamando a palavra da vida, e declarando com simplicidade as verdades fundamentais do evangelho de Jesus Cristo.

            É minha esperança que estas palavras sejam guia para ajuda-lo na redescoberta do evangelho em  toda a sua beleza, escândalo e poder salvador. É minha oração que essa redescoberta possa transformar a sua vida, fortalecer a sua proclamação e trazer maior glória a Deus.           

Seu Irmão,
Paul David Washer.

Cap. 1 Segurança Bíblica: Falsa Segurança.

Tito 1:16. Confessam que conhecem a Deus, mas negam-no com as obras, sendo  abomináveis, e desobedientes, e reprovados para toda a boa obra.
(...)
Mateus 7:22-23. E então lhes direi abertamente: Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade.
            (...), chegamos a um lugar crucial no estudo do evangelho e da salvação. Como posso saber que nasci de novo, que sou verdadeiramente filho de Deus?  Como saber que tenho realmente crido para a vida eterna? A seriedade dessa questão se torna mais aguda, porque a pregação e o evangelho no século XXI alteraram de maneira radical o conteúdo do evangelho; a sua chamada e o meio pelo qual as pessoas obtém a segurança da salvação.
            O chamado ao evangelho de arrependimento e fé foi substituído por um chamado para aceitar a Cristo e repetir a oração do pecador; que frequentemente se encontra no final dos folhetos e na conclusão de convites públicos cheios de emoção e muitas vezes manipuladores. (...), essa segurança é garantida por um pastor bem intencionado, que rapidamente pronuncia a plenos benefícios  da salvação sobre qualquer pessoa que tenha orado pedindo para receber a Cristo, mesmo que seja sem qualquer grau aparente de sinceridade (p.17-18).
            Essas drásticas alterações no evangelho resultam em multidões de pessoas com pouca evidência da graça salvadora (...). Elas acreditam que foram salvos; carrega no coração essa segurança, e têm a afirmação de uma autoridade religiosa. Raras vezes ouviram uma advertência evangélica para esvaziar confessores de fé, nem foram admoestados[3] a fazer um autoexame á luz das Escrituras ou testados á procura de evidências objetivas de conversão. Não sentem a urgência nem encontram necessidade de tornar verdadeiros seus chamados à eleição (Mateus 7:13-27; 2 Coríntios 13:5; Tito 1:16; 2 Pedro 1:10).
            1.1 Uma Advertência a Pastores: (...), essas opiniões faltosas e perigosas são resultado de ministros que pregam negligentemente, manuseando o evangelho sem nenhuma cautela, tratando da alma das pessoas de maneira superficial. O estudo sério e dedicado da verdade Bíblica, é a única coisa que possui o poder de dar aos homens uma alta visão de Deus, uma estima certa pelo evangelho e um saudável temor de descartar a solene responsabilidade imposta sobre os pastores.
            Os homens que usam do reducionismo do evangelho (acréscimo nosso) trocaram seus mantos por metodologias, profecia por pragmatismo e o poder do Espírito Santo por estratégias de mercado habilmente maquinadas. Como pastores a quem muito foi dado e de quem muito será requerido, precisamos guardar, por intermédio do Espírito Santo, o tesouro que nos foi confiado. Temos que voltar aos antigos caminhos marcados pela Palavra de Deus (Lucas 12:47-48; 2 Timóteo 2:14; Jeremias 6:16).
            Precisamos estar absorvidos pela Escritura, para que nosso progresso na piedade e nossa utilidade para o ministério do evangelho sejam evidentes a todos. Temos de cuidar de nós mesmos e de nosso ensinamento, especialmente ao ensinarmos o evangelho, pois quando o fazemos, asseguramos tanto nossa própria salvação quanto de nossos ouvintes. O destino eterno das pessoas e a reputação da igreja dependem de nossa diligência e fidelidade nessas altas questões (1 Timóteo 4:15-16).
            Temos de nos lembrar de que Cristo tem uma igreja composta por aqueles que foram regenerados pelo poder do Espírito Santo, que se arrependeram e creram para a salvação e continuam andando e crescendo na graça. Esta igreja é criação de Deus e uma de suas obras mais espetaculares. A igreja é um empreendimento importante, e todos nós, ministros e leigos igualmente, fomos chamados a contribuir para sua edificação, e não para causar danos insuportáveis. Essa ameaça presente, foi o que motivou a admoestação do apóstolo Paulo à igreja da cidade de Corinto.

1 Coríntios 3:11-15. Porque ninguém pode pôr outro fundamento além do que já está posto, o qual é Jesus Cristo. E, se alguém sobre este fundamento formar um edifício de ouro, prata, pedras preciosas, madeira, feno, palha. A obra de cada um se manifestará; na verdade o dia a declarará, porque pelo fogo será descoberta; e o fogo provará qual seja a obra de cada um. Se a obra que alguém edificou nessa parte permanecer, esse receberá galardão. Se a obra de alguém se queimar; sofrerá detrimento (dano, perda); mas o tal será salvo, todavia como pelo fogo.
           
Jesus Cristo é a pedra fundamental  da igreja (angular ou de esquina), portanto, o seu fundamento é inabalável. Por outro lado, fomos chamados a contribuir sobre esse fundamento com temor e tremor que flui de duas fontes: Primeira, sabemos que nossas contribuições podem fortalecer ou enfraquecer e embelezar ou estragar a beleza da igreja (Salmo 118:2; Josué 28:16; Mateus 21:42; Atos 4:11; 1 Pedro 2:6-7).
Segunda, sabemos que seremos julgados pela qualidade de nosso ministério para com a igreja. Naquele dia, o valor de nosso labor será revelado pelo fogo. Mesmo que sejamos salvos pela graça de Deus e pelo sangue do Cordeiro, é possível que testemunhemos a queima de todos os nossos esforços. Esses e outros aspectos, deveriam mover o ministro do evangelho a ser cuidadoso em suas atitudes, principalmente na pregação do evangelho e no cuidado das almas (p.20).
1.2 Os Perigos da Falsa Segurança: Muitos têm tratado o evangelho de forma relaxada, generalizando suas verdades essenciais e reduzindo seu conteúdo do mais baixo denominador comum, a fim de incluir maior número de pessoas que professam, para que façam parte da comunhão. O glorioso evangelho de nosso Bendito Deus se tornou um credo raso, composto de algumas leis ou princípios espirituais.
Devido a um púlpito enfraquecido por ignorância, pragmatismo e temor, a igreja professante está cheia de pessoas que nunca foram, de verdade, confrontadas com o evangelho de Jesus Cristo. Nunca ouviram nenhuma advertência do evangelho e possuem pouco entendimento da segurança Bíblica autentica. Além disso, muitos evangélicos explicam a falta de santificação dessas pessoas e seu mundanismo por uma dos mais perigosos termos que já apareceu: o Cristão Carnal.
Essa doutrina é uma contradição direta dos ensinamentos de Cristo e dos Apóstolos. Além do mais, isso abre a porta para pessoas carnais e não regeneradas encontrarem segurança da salvação ou olhar a aparente sinceridade de sua decisão passada de comunhão, mesmo que seu modo de vida contradiga tal profissão (p.21-22).
1.3  Salvação de Senhorio: existe um debate entre os cristãos sobre esse tema. Os proponentes deste ensino creem que a salvação requer que a pessoa não somente receba a Jesus Cristo como Salvador, mas também como Senhor. O outro grupo ensina e defende que, para que a pessoa seja salva, ela precisa apenas receber a Cristo como seu Salvador. Eles argumentam que exigir a submissão do senhorio de Cristo seria contradizer a doutrina da salvação somente pela graça e somente mediante a Fé.  Eles acrescentam em sua defesa que “Se uma pessoa tem de se submeter ao senhorio de Cristo para obter a salvação, então ela deixa de ser baseada na graça, e passa a ser baseada nas obras” (Efésios 2:8; Romanos 11:6).
Defendo que o chamado à submissão ao senhorio de Jesus seja aspecto inerente e essencial do chamado do evangelho aos pecadores. Além do mais, defendo que o crescimento daquele que professa ser cristão é um progresso gradativo na submissão ao Senhor Jesus Cristo e é evidência da conversão autêntica. Minhas convicções são fundamentadas sobre as seguintes verdades:
Primeiro, Cristo ensinou a absoluta necessidade de submissão sincera e prática ao seu senhorio como aspecto essencial da salvação. Ela não requer somente uma confissão de que Jesus é o senhor. Também requer uma prova dessa confissão. Na conclusão do Sermão do Monte, Ele severamente advertiu seus ouvintes que a submissão ao seu senhorio era a grande prova da verdadeira confissão. Em suas próprias palavras, disse: “Pequena é a porta, estreito o caminho que conduz a vida, e poucos a encontram, mesmo entre aqueles que declaram enfaticamente que Jesus é o senhor”.

Mateus 7:13-14,21. Entrai pela porta estreita (larga é a porta, e espaçoso, o caminho que conduz para a perdição, e são muitos os que entram por ela), porque estreita é a porta, e apertado o caminho que conduz para a vida, e são poucos os que acertam com ela. (...). Nem todo o que diz: Senhor, Senhor! Entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus.

            Cristo não está ensinando uma salvação baseada em obras, mas uma verdade que percorre toda a Escritura. A submissão ao senhorio de Deus e de Cristo, ou seja, obediência à vontade de Deus, é evidência da fé salvadora.
            Segundo, a submissão ao senhorio de Cristo era um aspecto essencial da proclamação apostólica do evangelho. Ninguém pode negar que os apóstolos solenemente testificaram a judeus e gregos que Deus fez deste Jesus, a quem o mundo crucificou Senhor e Cristo. Além do mais, de acordo com a proclamação apostólica do evangelho, a confissão do senhorio universal de Cristo pela pessoa é essencial para a salvação (p.22-23).
            O apóstolo Paulo ao escreveu sobre o assunto na Epístola aos Romanos, disse: “Se, com a tua boca confessares Jesus como Senhor e, em teu coração, creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo”.  Esta é uma das mais importantes declarações confessionais das Escrituras. Estaremos nós, ou mesmo o apóstolo, apenas chamando os pecadores a uma confissão vazia do senhorio de Cristo? Eles deverão apenas confessar a Jesus como Senhor sem nenhuma intenção de submeter-se à sua vontade?
            É errado suscitar ou sugerir (concordar) com essa possibilidade. Além do mais, acabamos de considerar que qualquer confissão do senhorio de Cristo que não se manifeste em cumprir a vontade de Deus é vazia, e resulta em ruína eterna (Mateus 7:23).
            Terceiro, as objeções muitas vezes levantadas contra o senhorio na salvação parecem resultar de um mau entendimento da natureza da salvação, especialmente das doutrinas de regeneração e perseverança.  As Escrituras ensinam que uma submissão prática e discernível ao senhorio de Jesus[4] é evidência essencial de salvação e meio de segurança, elas jamais interferem que a salvação ou a perseverança do Cristão seja resultado de obras. Essa submissão não causa nem preserva a salvação, mas é o resultado da grande obra de Deus da salvação do crente (p.24).
            Devido à obra regeneradora e santificadora do Espírito todo cristão autêntico crescerá em submissão ao senhorio de Jesus Cristo e em conformidade com ele. Isto não quer dizer que todo cristão cresce no mesmo grau ou compasso, nem requer que um crente mostre evidência do progresso em qualquer dado momento. A Confissão de Fé de Londres de 1689 e a Confissão de Fé de Westminster concordam no capitulo 13, artigos de 1-3:

Os que são eficazmente chamados e regenerado, havendo sido criado neles um novo coração e um novo espírito, são além disso, santificados genuína e pessoalmente, pela virtude da morte e ressurreição de Cristo, por sua Palavra e seu Espírito neles habitando; o domínio de todo o corpo do pecado é destruído, e suas diversas concupiscências mais e mais enfraquecidas e mortificadas, e eles mais e mais vivificados e fortalecidos em todas as graças salvificas para a prática da genuína santidade, sema a qual ninguém verá o Senhor.
Esta santificação permeia o homem todo, ainda que seja imperfeita nesta vida; aí permanece ainda resíduos de corrupção em cada parte, e daí suscita-se uma guerra contínua e irreconciliável: a carne digladiando contra o Espírito, e o Espírito contra a carne. Nesta guerra, ainda que o restante da corrupção permaneça por algum tempo, contudo, através de um contínuo suprimento de força por parte do Espírito santificante de Cristo, a parte regenerada vence, e assim os santos crescem na graça, aperfeiçoando sua santidade no temor de Deus (p.25).

            Como se não bastassem essas confissões para demonstrar que a fé autêntica e salvadora é evidenciada pela santificação e produção de fruto (obras), podemos voltar a Confissão Belga de 1561, em especial, aos artigos 22 e 24. Neles vemos a concordância entre a doutrina da salvação somente pela fé, e o claro ensinamento da Escritura de que tal fé salvadora é evidenciada pelas obras:

Portanto, dizer que Cristo não é suficiente, mas que também é necessário algo mais é enorme blasfêmia contra Deus – pois segue que Jesus Cristo seria apenas meio salvador (...). E poderíamos dizer justamente com Paulo que fomos justificados “somente pela Fé” e “a parte das obras da lei” (Romanos 3:28);
Cremos que esta verdadeira fé, produzida no homem por ouvir a Palavra de Deus e pela obra do Espírito Santo, o regenera e o torna em “nova criatura” (2 Coríntios 5:17), fazendo com que viva em “novidade de vida” (Romanos 6:4) e livrando-o da escravidão do pecado (...). Assim, é impossível que esta santa fé seja infrutífera no ser humano, visto que não falamos de fé vazia, mas daquilo que a Escritura chama de “fé operando pelo amor” (Gálatas 5:6); que conduz o homem a fazer por si a obra que Deus ordenou em sua Palavra (p.26).

            A salvação é só pela graça, só pela fé, no entanto, a natureza da salvação garante que a fé salvadora terá evidências reais e práticas. Embora todos os cristãos estejam sujeitos a muitas falhas (cometimento de pecados) e possam cair diante das menores tentações, a sua determinação de continuar na fé, bem como sua santificação gradual e progressiva, são grandes evidências de salvação, e oferecem base sólida para a segurança.

Cap. 2 – Examinar a Si Mesmo.

1 João 5:13. Estas coisas vos escrevi, os que credes no nome do Filho de Deus, para que saibais que tendes a vida eterna, e para que creiais no nome do Filho de Deus.
(...)
2 Coríntios 13:5. Examinai-vos a vós mesmos, se permaneceis na fé; provai-vos a vós mesmos. Ou não sabeis quanto a vós mesmos, que Jesus Cristo está em vós? Se não é que fá estais reprovados.

            Consideraremos agora outra doutrina essencial que se refere ao relacionamento do Cristão com Deus: a segurança. Qual é a base de segurança do crente de que seus pecados foram perdoados e de que ele foi reconciliado com Deus?
            As Escrituras estão repletas de advertências graves e solenes contra os que professam fé em Cristo, mas O negam por suas obras; que enfaticamente declaram o seu senhorio, no entanto, são rejeitados  no dia do juízo; que creem ser ovelhas, mas são contados entre os bodes e mandados ao castigo eterno. A salvação é somente pela graça e somente pela fé, mas como saber se a fé salvadora requerida é a fé que possuímos? A salvação é dada aos que creem, mas como saber se realmente cremos? (Mateus 7:21-23; Tito 1:16).
            2.1 A Necessidade do Exame de Si Mesmo: a igreja de Corinto foi singularmente abençoada. Pela própria admissão do apóstolo Paulo, foram enriquecidos em Cristo em toda palavra e conhecimento, de forma que não lhes faltavam nenhum dom. Porém, havia entre eles grandes problemas, entre eles; divisão entre os membros, ciúmes e contendas, superioridade e orgulho, imoralidade, mundanismo, abuso de liberdade, desordem nos cultos, e quase negação da doutrina da ressurreição. Sendo assim, o apóstolo tinha toda a razão de repreendê-los severamente:

1 Coríntios 3:1-3. E eu, irmãos, não vos pude falar como a espirituais, mas como a carnais, como a meninos em Cristo. Com leite vos criei, e não com carne, porque ainda não podíeis, nem tampouco ainda agora podeis. Porque ainda sois carnais; pois, havendo entre vós inveja, contendas e dissensões, não sois porventura carnais, e não andais segundo os homens?

            Paulo não escolheu palavras animadoras para repreender a congregação de Corinto, mas usou de uma linguagem forte, denunciando-os como cristãos infantis (meninos), ainda incapazes de receber e aproveitar do alimento mais sólido (mais consistente) ou ensinamento maduro. E pior, ele lhes falou como a homens carnais ou não regenerados, que não tem o Espírito de Deus e andam como os gentios (Efésios 4:17-19).
            Encontramos aqui, o “modus operandi” do ministro fiel, bem instruído, quando confrontado pelos que dizem ter fé e se contradizem por seu modo de vida. Como não possui a onisciência, ele precisa discernir uma de duas possibilidades: A primeira é que aqueles que professam ter fé são imaturos ou crentes desviados que podem ser restaurados (e o serão) pela Providência de Deus, auxílio do Espírito e a administração correta da Palavra de Deus: ensino, repreensão, correção e treinamento. A segunda possibilidade é que os que professam a fé ainda não são convertidos. Eles têm forma de piedade, mas negam seu poder; professam fé em Cristo, mas por seu modo de viver, O negam (2 Timóteo 3:5,16).
            Antes que continuemos, temos de declarar claramente que o cristão autêntico não é totalmente santificado nesta vida. A carne não será totalmente erradicada até a sua glorificação final no céu (Gálatas 5:17). Porém, haverá uma grande diferença entre o cristão sincero, por mais fraco que seja, que luta contra o pecado e só consegue progresso mínimo de santificação; e o falso convertido, que diz ter fé em Cristo, mas vive em estado quase constante de mundanismo, sem ofender sua consciência, sem quebrantamento diante do pecado, sem confissão de coração. Por causa desses dois tipos de cristãos (acréscimo nosso), Paulo, no final de sua segunda Epístola, que foi dirigida aos Corintos, dá a diretiva aos que estavam se desviando: “Examinai-vos a vós mesmos se realmente estais na fé; (...).”
            A admoestação de Paulo aos que professavam Cristo em Corinto, era de examinar a si mesmo em busca de evidências da conversão, prova que a obra de Deus na salvação do cristão não somente resultará na justificação, mas também em uma santificação real, prática e observável. Deus não somente liberta o crente da condenação do pecado, mas continua trabalhando nele para livrá-lo do poder do pecado. Todo cristão se for autêntico e regenerado pelo Espírito Santo, tornou-se nova criatura, com um novo afeto por Deus e por sua justiça. Além do mais, o Espírito que regenera o crente agora opera em sua santificação. Esse cristão tornou-se feitura de Deus. E o Deus que começou nele boa obra a completará (p.29-30).
            Uma multidão de pessoas que professam ser cristãos, tanto no ocidente e em todo o mundo, vive em estado quase continuo de mundanismo, carnalidade e infrutuosidade. No entanto, ficam assentados tranquilamente em Sião, com a maior segurança da salvação e sem o mínimo temor de que tenham crido em vão. Para piorar a situação, pastores bem intencionados, que parecem entender pouco a natureza e o poder da salvação, os afirmam em seu perigoso estado.
            Esses ministros se tornaram como os profetas dos dias de Jeremias “curam superficialmente a ferida do meu povo, dizendo: Paz, paz, quando não há paz” (Jeremias 6:14). Deixaremos que eles se assentem  tranquilos em Sião enquanto o julgamento certo e visível da torre de vigília? Não clamaremos a eles:

Efésios 5:14. Desperta, ó tu que dormes, levanta-te dentre os homens mortos, e Cristo te iluminará.
(...)
2 Coríntios 13:5. Examinai-vos a vós mesmos se realmente estás na fé; provai-vos a vós mesmos. Ou não reconheceis que Jesus Cristo está em vós? Se não é que já estais reprovados.
(...)
2 Pedro 1:10. Por isso, irmãos, procurai, com diligência cada vez maior, confirmar a vossa vocação e eleição; porquanto, procedendo assim, não tropeçareis em tempo algum.

            Devemos aprender a consolar e dar segurança ao mais fraco santo que esteja quebrantado quanto aos seus muitos pecados, mas precisamos também aprender a admoestar o falso convertido, cuja vida é estéril, árvore sem frutos, cujo meio acomodado de viver é uma contradição ao evangelho (p.31-32).
            2.2 O Padrão do Atuoexame: as Escrituras ordena a nos examinar para verificar se estamos na fé, provar-nos para que possamos discernir se somos realmente cristãos. Qual seria o padrão de autoridade de nos julgar e ajudar-nos a entender nosso pleito?
            O apóstolo Paulo nos instrui sobre o fato de que não é sábio nos medir por nossos próprios padrões ou nos comparar com outros de nosso próprio círculo de comunhão (2 Coríntios 10:12). Se usarmos o homem carnal que professa a Cristo como o padrão, poderemos ser acalantados em falsa segurança. Porém, se nos compararmos ao cristão mais maduro de nossa comunidade, poderemos nos encontrar falsamente condenados. Além do mais, embora seja sábio buscar o conselho de outros nesta questão, não podemos basear nossa segurança de salvação apenas nas suas opiniões.
            Alguns poderão presumir e assegurar-nos erradamente por sua baixa visão da salvação, e outros poderão nos condenar erroneamente, ao exigir provas que excedam os ditames da Escritura, colocando fardos pesados sobre nós, os quais eles mesmos não estão dispostos ou não conseguem suportar (Jeremias 6:14-15; Mateus 23:4).
            Podemos ser gratos porque o padrão que buscamos não é tão escondido dentro do tecido da Escritura a ponto de ser mistério insondável, aberto somente para as mentes mais brilhantes. Pelo contrário, é específico e claramente exposto nas Escrituras. De fato, o padrão e as provas de autêntica conversão são apresentados de modo claro, conciso e completo na primeira Epístola do apóstolo João.

1 João 5:13. Estas coisas vos escrevi, os que credes no nome do Filho de Deus, para que saibais que tendes a vida eterna, e para que creiais no nome do Filho de Deus.
(...)
João 20:30-31. Jesus, pois, operou também em presença de seus discípulos muitos outros sinais, que não estão escritos neste livro. Estes, porém, foram escritos para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em meu nome.

            João escreveu seu evangelho para que seus leitores pudessem crer em Jesus Cristo e receber a vida eterna. Correspondentemente, escreveu sua primeira Epístola para que aqueles que realmente creram pudessem ter plena segurança de que receberam a vida eterna. Diversas autoridades sustentam o mesmo entendimento do apostolo João, entre eles, destaca-se o que disse John R. W. Stott:

Por toda esta epístola, João tem dado a seus leitores critérios (moral, doutrinário, social) pelos quais possam provar a si mesmos e aos outros. O seu propósito é estabelecer sua segurança. Juntando o propósito do Evangelho e da Epístola, o alvo de João tem quatro estágios: que seus leitores ouçam, e ao ouvir, creiam; e ao crer, vivam; e vivendo, conheçam. João procurou estabelecer a segurança de salvação, não em pensamentos desejosos, sentimentos religiosos ou mera confissão de fé, mas na demonstração ou manifestação das marcas autênticas do Cristianismo na vida deles. Em suma, é importante que nos lembremos de que João não está apresentando os meios de conversão, mas o seu resultado. Se nosso modo de vida estiver em grande contraste a descrição feita por João do verdadeiro cristão, devemos considerar seriamente uma de duas possibilidades: primeiro, podemos ser genuínos Filhos de Deus, mas nos desviarmos de sua vontade e temos grande necessidade de arrependimento. Se realmente nos arrependermos e voltarmos a vontade de Deus como nossa prática de vida, haverá grande esperança de que realmente cremos e temos vida eterna. Segundo, é de que nunca conhecemos ao Senhor, e tanto nossa fé quanto nossa confissão foram falsas desde o começo. Neste caso, temos de buscar o Senhor e chamá-lo. Se somos realmente arrependidos, podemos buscar com grande confiança, sabendo que ele não desprezará um espírito quebrantado e contrito, que todo aquele que vem a ele, com certeza nunca será lançado fora. Quem invocar o nome do Senhor será salvo, e quem nele crê não será confundido (Romanos 10:11-13; João 6:37 e Salmos 51-17).

Cap.3 – Andar na Revelação de Deus.

1 João 1:5-7. E esta é a mensagem que dele ouvimos, e vos anunciamos: que Deus é luz, e não há nele trevas nenhumas. Se dissermos que temos comunhão com ele, e andarmos em trevas, mentimos, e não praticamos a verdade. Mas, se andarmos na luz, como ele na luz está, temos comunhão uns com os outros, e o sangue de Jesus Cristo, seu Filho, nos purifica de todo o pecado.

            O grande propósito de João ao escrever sua primeira Epístola visava assegurar aqueles que creem em Jesus Cristo tenham grande segurança de possuir a vida eterna (1 João 5:13). A fim de realizar esse propósito, o apóstolo apresentou várias evidências ou características essenciais da conversão autêntica, pelas quais podemos examinar nossas vidas e provar a autenticidade de nossa confissão. Ele declara como sendo a primeira característica com a seguinte declaração: o Cristão andará na Luz, ou seja, seu modo de viver será conforme (nos moldes ou em conformidade) aquilo que Deus revelou sobre a natureza e a vontade divina (p37).
            3.1 Deus é Luz: no capitulo 1:5, da Primeira Epístola de João, ele começa com uma declaração extremamente importante: “Deus é luz e nele não habita treva alguma”. Habitualmente João usa as palavras “Luz e Trevas” em seus escritos, e é de vital importância que descubramos o significado dessas palavras no texto.
            A primeira vista, o contraste que ele faz entre luz e trevas pode nos levar a pensar que sejam primariamente termos morais: distinção entre o bem e o mal; ou a grande divisão entre o santo e o profano. Porém, quando ele escreve que Deus é luz, ele não só denota a pureza moral de Deus, como também indica que Ele se faz conhecido, isto é, o Deus das Escrituras não está escondido no escuro e, especialmente, por meio da encarnação e obra redentiva de seu Filho, Jesus Cristo.
            Para ter esse entendimento, devemos considerar o contexto histórico desta primeira Carta de João. A igreja ou as igrejas ás quais ele direcionou esta escrita, tinham caído sob a influencia de um falso ensinamento, o qual, mais tarde evoluiu para uma das maiores heresias que veio a confrontar a igreja – o gnosticismo, ou seja, uma mistura de filosofia grega, misticismo judaico e cristianismo. Era uma religião esotérica*, repleta de mistérios, conhecimento secreto e um deus escondido, que só poderia ser conhecido pelos iniciados (linguagem da maçonaria) ou pelos escalões superiores dos superespirituais (p.38).
            Para combater essa heresia perigosa e destrutiva, João explica que Deus é luz, e fez conhecida a sua vontade e a si mesmo por meio do testemunho dos apóstolos, que eram testemunhas oculares da encarnação, por meio de ensinamento do Espírito Santo, a quem todos receberam. Ele declara que Deus não era possessão exclusiva de apenas um punhado de superapóstolos autoproclamados, mas Ele revelou a si e também revelou a sua vontade a todos quantos creram em Cristo e nasceram de Deus. Também sabemos que o Filho de Deus é vindo e nos tem dado entendimento para reconhecermos o verdadeiro; e estamos no verdadeiro, em seu Filho, Jesus Cristo. Este é o verdadeiro Deus e a vida eterna (1 João 1:1-4; 5:20).
            Podemos concluir com confiança o seguinte: a declaração de que “Deus é luz”, não se refere somente ao seu impecável caráter moral, mas também a seu relacionamento com todo cristão em Jesus Cristo e a sua revelação a eles. Deus nunca se escondeu de seu povo, mas graciosa e abundantemente revelou a este povo tanto a sua natureza quanto a sua vontade (p.38-39).
            3.2 O Significado da Comunhão: essa palavra é derivada do substantivo grego Koinonía, usada comumente para denotar associação, comunhão ou participação conjunta. Os que se encontram fora da comunhão com Deus ainda não são convertidos, estão mortos em suas transgressões e pecados, e estão sob a ira de Deus. Em tempos recentes, o significado dessa expressão no contexto em exame, tem sido mal interpretado (Efésios 2:1-3; 5:6).
            Alguns crêem e ensinam que João não faz distinção entre os que realmente crêem e aqueles que ainda não se converteram, mas faz distinção entre cristãos espirituais que comungam com Deus, e cristãos carnais que estão fora da comunhão com Ele. Essa interpretação diverge do verdadeiro significado do texto, como também trai o propósito para o qual João escreveu toda esta Epístola. Além do mais, o versículo sete ensina que somente quem anda na luz pode se valer do sangue purificador do Filho de Deus (p.40).
            Concluímos, á  luz dessas verdades, que ter comunhão com Deus é ser possuidor de todos os benefícios e bençãos da obra expiatória de Cristo. Por outro lado, estar fora desta comunhão com Deus é ainda não ter se convertido, estar separado de Deus, em perigo de destruição eterna.
            3.3 O Cristão anda na Luz: outra característica a ser evidenciada no/pelo Cristão autêntico é que: ele anda na luz. A palavra “andar” é traduzida verbo grego Peripatéo, que significa literalmente andar em volta ou ao redor. Metaforicamente, é usada para denotar o modo de vida ou a conduta da pessoa. O verbo está no tempo presente, denotando ser uma ação continua. Sendo assim, o verdadeiro Filho de Deus deve andar na luz, isto é, estar constante e continuamente na presença de Deus (acréscimo nosso).
            Por outro lado, o falso convertido anda em trevas. Seu estilo de vida (ou conduta) reflete uma ignorância (desconhecimento) de Deus autoimposta e sua conduta demonstra pouca conformidade à natureza de Deus como revelado nas Escrituras. Temos de tomar cuidado para entender que João não está ensinando que um cristão pode alcançar algum nível de perfeição sem pecado, (...). Nem está sugerindo que a vida do cristão será sempre um reflexo perfeito do caráter e da vontade de Deus (p.39-40).
            Ele está simplesmente declarando que o estilo de vida ou a conduta geral do cristão autêntico refletirá em conformidade ao que Deus tem revelado sobre si e sobre sua vontade. Além do mais, embora sua vida seja sacudida por grandes lutas e marcada por fracassos, haverá diferença marcante entre sua vida e conduta do descrente (incrédulo ou ímpio). A evidência da salvação é que, sob cuidadoso exame de nossa vida (autoexame), vemos uma real e crescente conformidade à natureza e vontade de Deus (p.41).
            Quando estamos falando de autoexame, não nos referimos a um momento no tempo ou a um único evento, mas a todo o curso de nossa vida, desde o momento que professamos nossa conversão. Mesmo o cristão mais maduro terá lapsos morais momentâneos e tempos de poda em que parece haver poucos frutos. Seria muito presunçoso confirmar nossa salvação com base no cuidadoso exame de uma única boa obra ou no decurso de apenas um dia, e seria igualmente insensato nos condenar por uma única caída em pecado.
            Temos de nos perguntar se no decurso de toda nossa vida cristã há evidências de conformidade cada vez maior com a pessoa e vontade de Deus. Por isso, precisamos examinar corretamente nossa profissão de fé e considerarmos a totalidade de nossa vida, desde o momento em que professamos a conversão até o momento atual.
            3.4 Estamos andando na Luz? Depois de entendermos o significado do texto, precisamos fazer com que a aplicação dessas verdades ocorra em nós mesmos. Existe distinção detectável entre nossa maneira de viver e a dos incrédulos? Se um observador imparcial fosse estudar a vida de cada um de nós em um período de tempo, teria juntado provas suficientes para argumentar pela validade de nossa fé em um tribunal de justiça ou sua causa seria jogada fora do tribunal por falta de evidências?
            Diz o texto: “Deus é luz, e não há nele treva alguma” (1 João 1:5). Temos andado em conformidade para haver semelhança a essa luz? Andamos como filhos da luz, produzindo os frutos advindos dessa luz que consistem de toda bondade, justiça e verdade? No entanto, se dissermos que somos verdadeiros cristãos, mas andamos nas trevas, somos mentirosos. Teremos que reconhecer que entramos pela porta larga e estamos andando pelo caminho largo que nos leva a destruição (Mateus 7:13).
            Se dissermos que temos comunhão com Deus e andarmos na luz, teremos passado a primeira prova de João ao caminho de plena segurança da salvação. Colocamos a primeira pedra no muro de esperança, fundamentado sobre as Escrituras e revestido contra os dardos da dúvida, inflamados pelo inimigo. Temos de ser encorajados, mas não presunçosos.

Cap. 4  Confessar Pecado.

1 João 1:8-10. Se dissermos que não temos pecado, enganamo-nos a nós mesmos, e não há verdade em nós. Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados, e nos purificar de toda a injustiça. Se dissermos que não pecamos, fazemo-lo mentiroso, e a sua palavra não está em nós.
           
            A marca do verdadeiro cristão não é a perfeição sem pecado, mas que o pecado torna-se cada vez mais repugnante para ele, mais antagônico a seus desejos. A realidade do pecado o conduz ao arrependimento e a confissão. Essa verdade é sustentada por algumas das maiores declarações nas Escrituras quanto ao crente e sua atitude diante do pecado: “Sacrifícios agradáveis a Deus são o espirito quebrantado, coração compungindo e contrito, não o desprezará, ó Deus” (Salmo 51:17).
            O nosso Deus sempre olha para o homem “aflito e abatido de espírito e que treme da minha palavra” (Isaías 66:2). A grande evidência de que nos tornamos filhos de Deus é que, ao nos tornarmos cônscios de nosso pecado, respondemos com humildade, quebrantamento, contrição, lamento e tremor diante da lei que rejeitamos (p.44-45).
            Deus prova que nossas frequentes lutas contra o pecado não desmerecem a profissão de fé, e sim a confirmam. Sabemos que o conhecemos não porque não temos pecado, mas porque nossa atitude para com o pecado foi radicalmente alterada: temos crescente ódio (ojeriza) pelo pecado, nos quebrantamos diante dele e o confessamos.
            4.1 A Nova Relação do Crente com o Pecado: antes da conversão e regeneração, o pecador é amante de si mesmo e dos prazeres, odeia a Deus e o bem. Jó observou que homens não convertidos têm sede de iniquidade e a bebem como água (Jó 15:16). A razão para tal inclinação e comunhão com o mal é clara através de toda a Escritura, mas particularmente no conselho do profeta Jeremias, que descreve o coração do homem caído: “enganoso é o coração do homem, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto. Quem o conhecerá” (Jeremias 17:9).
            É este coração caído que nutre e produz no homem natural um grande afeto pelo pecado e igualmente grande desdém por Deus e sua justiça. No entanto, na gigantesca obra da conversão, Deus recria o coração conforme a sua imagem, em verdadeira justiça e santidade. O amor por si mesmo foi substituído pelo amor a Deus e sua sede de iniquidade substituída por fome e sede de justiça (Efésios 4:24; Mateus 5:6).
            O cristão agora ama ao Deus que outrora odiava, e odeia o eu que antes amava; agora ele deseja a justiça que antes desprezava e despreza a injustiça que antes se gabava. A luta do cristão contra o pecado não é porque ela seja menos poderosa do que tenho descrito, mas porque o novo coração do crente ainda se opõe a um grande e aparentemente implacável inimigo – a carne.
            Das várias definições dessa expressão “carne”, temos de aceitar que existe algum remanescente do velho homem que permanece junto do crente, até ser erradicado na glorificação final. O apóstolo Paulo apresenta a realidade dessa batalha nas seguintes palavras direcionadas ás igrejas da Galácia: “Porque a carne milita contra o espírito, e o espírito contra a carne, porque são opostos entre si; para que não façais o que, porventura, seja do vosso querer” (Gálatas 5:17).
            Agora o seu pecado não é mais causa de prazer e jactância, mas de profundo pesar e confissão. Ele não é mais “filho do Diabo” ou “filho da Desobediência, mas sim, Filho de Deus e nova criatura em Cristo Jesus (João 8:44; 2 Coríntios 5:17; Efésios 2:2; 1 João 3:12). Assim, ele tem de confessar e se livrar do pecado (p.48).
            4.2  Verdadeira Confissão: a palavra confessar é traduzida do grego Homologéo, um composto da palavra Homos que significa “mesmo”, e Logos que quer dizer “palavra”, ou seja, significa literalmente “falar a mesma coisa”. Portanto, confessar é concordar com Deus verbalmente que pecamos e que esse nosso pecado é hediondo.
            Embora a vida do cristão seja marcada por crescimento em santidade e maior poder sobre o pecado, ele nunca será completamente livre de uma influência até ser glorificado no céu. Mesmo o cristão mais maduro vai pecar, mas quando ele peca, Deus é fiel em expor o seu pecado e convencê-lo de sua culpa pelo ministério do Espírito Santo (João 16:8,13; Romanos 8:14). Em resposta, ele reconhece o seu pecado e a gravidade dele. Então se volta a Deus com o coração quebrantado e contrito, o confessa e pede o perdão. Um exemplo desse comportamento foi o do rei Davi (Salmo 51:1-4).
            Não nos foi dito pela fonte mais confiável que temos de um sumo sacerdote que se compadece de nossas fraquezas; porque ele foi tentado em todas as coisas, a nossa semelhança, mas sem pecado? O cristão deve odiar o pecado que cometeu e até desprezar as roupas que vestia no momento de sua falha moral, e as considerar imundas e contagiosas. O pecado que outrora era refeição deleitosa se tornou em barril de sujeira, a vida de pecado que era antes fragrante leito (aroma, odor e fragrância) se tornou em chiqueiro enlameado de estrume (p.49-50).
            Nesta passagem, nota-se que Davi não deu desculpas, mas confessou tudo abertamente perante todos: “Pequei contra o Senhor (...)”. E no Salmo 51 ele é mais explicito: “Pois eu conheço as minhas transgressões, e o meu pecado está sempre diante de mim (Salmo 51, 2 Samuel 12:13). No final, a sua reação demonstra que ele é realmente uma nova criatura, o antigo se passou e veio o que é novo. Davi não tentou dissipar sua culpa, mas reconheceu o que Deus disse sobre ele como sendo a verdade. Isto é, concordou com Deus quanto ao seu pecado e disse a mesma coisa (homologéo). Esta é a marca da verdadeira confissão.
            4.3  O Cristão é Marcado pela Confissão: a medida que o crente cresce em santidade experimentará mais liberdade do poder do pecado e caminhará em maior vitória sobre o mesmo. Contudo, ao mesmo tempo, desenvolverá entendimento mais agudo da santidade de Deus e mais forte sensibilidade ao pecado em sua vida. O resultado será que a sua vida será marcada por maior profundidade de quebrantamento e confissão.
            Isso acontece simplesmente porque a santidade de Deus e seu próprio pecado são realidades maiores para ele. Quando o cristão cresce no conhecimento de Deus, o seu conhecimento de si mesmo e do seu pecado é também amplificado. Essa relação compreendida propriamente, resultará em tristeza mais profunda pelo pecado, mas não em desespero. (...), a coisa mais maravilhosa sobre essa transformação é que o crente encontra cada vez menos alegria em seu próprio desempenho, e cada vez maior alegria na obra perfeita e imutável de Cristo.    Uma maior consciência de nosso pecado e de nossa incapacidade, nos conduzirá a voltar os olhos para a perfeita obra de Cristo e nossa confissão do pecado, resultará em perdão e purificação concedida pelo nosso Pai Celestial (p.50-51).
            4.4 Perfeição Cega: as Escrituras confirmam que uma das maiores evidências da conversão autêntica é vida marcada por um reconhecimento do pecado, espirito quebrantado e contrito, confissão aberta e sincera do pecado perante Deus. Porém, no mesmo grau, umas das maiores evidências da falsa conversão é a cegueira quanto ao pecado, a dureza do coração e uma vida sem autentica confissão. Em 1 João 1:8-10, o apostolo chega a três terríveis conclusões a respeito da pessoa que professa a fé em Cristo, mas vê pouca razão para arrependimento ou confissão.
            Primeiro; tal pessoa estaria enganando a si mesma. (...). Quanto tempo o ferro quente terá de apoquentar sua consciência a ponto dela ter coragem de se firmar ao lado de Jesus Cristo, dizendo desafiadoramente: “  Quem dentre vós me convence de pecado” (João 8:46; 1 Timóteo 4:2). É sabido entre pastores que sempre que Deus move expondo o pecado e quebrantando os corações em uma congregação, são os mais devotos e dedicados os movidos às lágrimas e a confissão aberta do pecado, enquanto os membros mais carnais e apáticos da igreja, ficam sentados nos bancos, gelados como pedras. Não são movidos pelo Espírito de Deus, e até mesmo a contrição e confissão aberta das melhores pessoas a seu redor, não tem efeito sobre eles. Qual a razão deste contraste tão grande numa mesma congregação?
            A resposta é bem simples, como também brutal: estamos apenas testemunhando a pré-estreia do grande dia do juízo, quando os cabritos serão destacados e separados das ovelhas. As ovelhas são sensíveis a obra de convicção do Espírito e levadas a confissão, enquanto os bodes são os que não enxergam nenhuma mancha ou defeito em si, e estão perfeitamente contentes em sua confortável religião.
            Segundo; se referem a aqueles que dizem não ter pecado não têm a verdade. Isso inclui, também os que professam fé em Cristo, mas estão cegos ou indiferentes quanto ao pecado continuo em sua vida. A convicção do pecado, a contrição e a confissão estão ausentes de sua rotina diária. Contradizendo essa vã e perigosa ilusão, João dá a seus leitores uma dupla advertência dentro do espaço de apenas três versículos: “Se dissermos que não temos cometido pecado (...), a sua palavra não está em vós”.
            Terceiro; João conclui que a pessoa que diz não ter pecado faz de Deus um mentiroso. A universalidade do pecado é um dos temas mais proeminentes e consistentes que percorrem a Escritura: “todos pecaram e carecem da glória de Deus” (Romanos 3:23). Nem mesmo entre os mais piedosos santos do Antigo Testamento ou entre os Apóstolos temos exemplo de aperfeiçoamento ou qualquer afirmativa documentada de que entre os filhos de Adão, a não se Cristo, alguém tenha alcançado um patamar de perfeição, sendo isento de pecado.
            O grande apóstolo Paulo disse aos Coríntios: “Sede meus imitadores, como também eu sou de Cristo”, mas nunca reivindicou a perfeição, dando o seguinte testemunho aos Filipenses: “Não que já a tenha alcançado, ou que já seja perfeito; mas prossigo para alcançar aquilo para o que fui também preso por Cristo Jesus.  Irmãos, quanto a mim, não julgo que o haja alcançado; mas uma coisa faço, e é que, esquecendo-me das coisas que atrás ficam, e avançando para as que estão adiante de mim. Prossigo para o alvo, pelo prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus” (Filipenses 3:12-14).
            Se cremos que Deus é autor e preservador de todos (e de tudo), conforme as Escrituras, e que cada palavra procede de sua boca, temos de conceder que uma pessoa que argumente em defesa da sua própria retidão moral está argumentando contra Deus. Ele se opõe contra a opinião de Deus e o está declarando enganador e mentiroso. Esta não é opinião, atitude ou oração de um Filho de Deus (Mateus 4:4; 2 Timóteo 3:16).
            4.5 A Confissão é Realidade em Nossa Vida? (...), a própria natureza da salvação nos assegura que se somos cristãos, andaremos na luz de Deus e aos poucos cresceremos em conformidade com a sua natureza e vontade. (...), podemos concluir corretamente que os que professam a fé somente em Cristo, mas continuam andando de modo contrário á pessoa e vontade de Deus, são culpados de presunção, possivelmente não convertidos e correm perigo de eterna destruição.
            (...), a evidência da conversão autêntica não é perfeição isenta de pecado, mas uma vida marcada por autêntico arrependimento e confissão. Finalmente, quem professa ter fé em Cristo, mas vive em pecado, com pouco ou nenhum quebrantamento e disciplina divina, deverá ter grande preocupação. Tendo aprendido estas importantes verdades, devemos examinar nossa vida e nossa profissão cristã à luz delas. Reagimos ao pecado com maior senso de repugnância e desdém? Lutamos contra isso? Será que o peso de nosso pecado, juntamente com a bondade de Deus, nos conduz ao arrependimento e confissão? Se a nossa resposta for sim, existe alguma evidência de que Deus fez em nós sua obra salvadora (p.56).

Cap. 5  Guardar os Mandamentos de Deus.

1 João 2:3-5. E nisto sabemos que o conhecemos: se guardarmos os seus mandamentos. Aquele que diz: Eu conheço-o, e não guarda os seus mandamentos, é mentiroso, e nele não está a verdade. Mas qualquer que guarda a sua palavra, o amor de Deus está nele verdadeiramente aperfeiçoado; nisto conhecemos que estamos nele.

Aprendemos ou consideramos até aqui duas grandes evidências da conversão autêntica. Primeiro, que o cristão autêntico aprende a andar na luz da revelação de Deus e a crescer em conformidade com a natureza e vontade divina. Segundo, que o cristão refletirá um novo relacionamento com o pecado. Crescerá sua aversão pelo pecado, e, se pecar, se arrependerá e o confessará abertamente diante de Deus (e dos homens, acréscimo nosso). Agora, no capitulo 2 de sua primeira Epístola, João apresenta uma terceira evidência de conversão autêntica: o crente guarda os mandamentos de Deus.
5.1  Provas de Fé: ele começa esta terceira evidência com a reafirmação do propósito da Carta: “Ora, sabemos que o temos conhecido por isto: se guardarmos os seus mandamentos”. João não está fazendo distinção entre dois tipos de cristãos ou traçando uma linha entre o espiritual e o carnal dentre o povo de Deus. Ele separa as ovelhas das cabras. O seu principal propósito é dar aos verdadeiros cristãos uma segurança Bíblica de salvação e, subsequentemente, ele expõe aqueles que professam ter fé em Cristo, mas permanecem não convertidos.
Para muitos hoje, essa declaração é dura e difícil de aceitar. No entanto, João está simplesmente seguindo o ensino e modelo estabelecido pelo Senhor, conforme está registrado em Mateus 7:7-19: a prova de uma boa árvore está nos bons frutos que produz, pois ela é conhecida por seus frutos. A maioria dos cristãos contemporâneos  consideram essa linguagem julgadora, severa e faltosa de amor.
No evangelicalismo contemporâneo, a salvação foi reduzida a nada mais que uma decisão humana de aceitar a Cristo e a vida que segue, depende inteiramente das contínuas escolhas certas no convertido. (...). Ele pode continuar carnal até o dia em que entrar na glória e for transformado. Embora haja alguma verdade nisso, como um todo, esse pensamento deve ser rejeitado como total heresia.
É verdade que o amor de Deus não coage, nem manipula e é igualmente verdade que o exercício da vontade humana é um elemento necessário tanto na conversão quanto na santificação. Porém, essa opinião ignora ou até mesmo nega pelo menos três importantes doutrinas inseparáveis da salvação. A primeira é a doutrina da regeneração. A pessoa que se arrependeu do pecado e creu no Senhor Jesus Cristo foi regenerada. Ela se torna nova criatura, com uma nova natureza e afetos totalmente transformados (mudança de vida, acréscimo nosso). Embora ainda lute contra a carne, o mundo e o diabo, e ainda que não seja aperfeiçoada até a sua glorificação final no céu, ela exibirá as características ou evidências da nova pessoa em que se tornou (p.58-59).
A segunda e terceira doutrinas são as verdades inseparáveis sobre a santificação e a providência divina. Se cremos na inspiração da Escritura e na fidelidade de Deus, então, junto com o apóstolo Paulo temos de estar persuadidos de que o Deus que começou a boa obra a completará na vida de todo crente. Pois Deus é quem opera no cristão, tanto no querer quanto no efetuar; por seu bom prazer (Filipenses 2:13).
O verdadeiro cristão será ensinado por Deus e guiado por seu Espírito. Se alguém diz ser filho de Deus pela fé em Cristo, mas vive na carnalidade sem intervenção da parte de Deus, as Escrituras o condenam como falso convertido e de filho ilegítimo: “É para disciplina que perseverais (Deus nos trata como filhos); pois que filho há que o pai não corrige? Mas, se estais em correção, de quem se têm tornado participantes, logo, sois bastardos e não filhos (Hebreus 12:7-8).
A natureza da salvação, a força de providência divina e a fidelidade de suas promessas que perduram e asseguram que o crente cresça, numa direção e exiba as características da nova vida que está nele. Por isso que Jesus diz: “Pelos seus frutos os conhecereis” (Mateus 7:16-20).
5.2 Obediência aos Mandamentos de Deus: este é um dos grandes indicadores da verdadeira conversão e do relacionamento correto com Deus. Tal verdade é destacada por Tiago:
Tiago 2:17-20. Assim também a fé, se não tiver as obras, é morta em si mesma. Mas dirá alguém: Tu tens a fé, e eu tenho as obras; mostra-me a tua fé sem as tuas obras, e eu te mostrarei a minha fé pelas minhas obras. Tu crês que há um só Deus; fazes bem, também os demônios o creem, e estremecem. Mas, ó homem vão, queres tu saber que a fé sem as obras é morta?

Aqueles que creem na inerrância e uniformidade da Escritura reconhecem que não há contradição entre os escritos de Tiago e a doutrina da justificação somente pela fé, como também ensinou claramente o apóstolo Paulo, inclusive propagado pela Reforma·. Paulo trata da causa da salvação, enquanto que Tiago está tratando de seu resultado. Sendo assim, os dois escritores nos dão uma visão compreensiva da obra de Deus na salvação.
Logo, a salvação é somente pela fé, e os que creem ou ensinam outra coisa estão sob maldição. Porém, a salvação mediante a fé resulta em obras, ou seja, obediência a lei. A pessoa que foi salva pela fé começa a viver uma vida em crescente conformidade com os mandamentos de Deus, não por alguma força de vontade renovada, mas porque foi regenerada e é habitada pelo Espirito de Deus (p.60-61).
Tudo isso vem de Deus, que nos reconciliou consigo mesmo por meio de Cristo, e quando entendemos isso corretamente, nos voltamos a Deus em adoração. O apóstolo Paulo sustenta também esta verdade e a reafirma tanto no livro de Efésios quanto no de Gálatas.

Efésios 2:8-10. Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus. Não vem das obras, para que ninguém se glorie; Porque somos feitura sua, criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus preparou para que andássemos nelas.

Gálatas 2:16. Sabendo que o homem não é justificado pelas obras da lei, mas pela fé em Jesus Cristo, temos também crido em Cristo Jesus, para sermos justificados pela fé em Cristo, e não pelas obras da lei; porquanto pelas obras da lei nenhuma carne será justificada.

            O apóstolo transmite de forma muito clara essa verdade que atravessa todos os tempos e é ensinada e defendida na Escritura. Ele declara explicitamente que a fé é o único meio para a justificação e passa a focar sua atenção às duas doutrinas que a acompanham: a providência de Deus e a sua obra de santificação na vida do cristão (p.61).
            Por que tantos púlpitos dos dias modernos estão cegos quanto a esta verdade? O Deus que é capaz de justificar o maior dos pecadores é também capaz de santifica-lo. Incontáveis pessoas estão sentadas nos bancos das igrejas a cada domingo, carnais e não santificados, não porque as promessas de Deus falharam, mas porque ainda não se converteram. Ela tem forma de piedade, mas negam o poder de Deus. Identificam-se com Cristo, mas “praticam iniquidades” como se Ele nunca lhes tivesse dado uma lei a ser obediência. Eles clamam “Senhor, Senhor”, mas não fazem o que ele manda. Naquele dia final, ouvirão a terrível sentença: “Apartai-vos de mim, os que praticais iniquidade” (Lucas 6:46; Mateus 7:23; 2 Timóteo 3:5).
            Isso não significa que quem foi genuinamente convertido nunca mais negligenciará à lei ou se desviará dela em desobediência. Não existe pessoa que não peque e nenhum de nós está isento da apatia que as vezes sobrevém sobre nossas almas e cega nossa razão. (...). Porém, significa que aqueles que foram regenerados pelo Espírito de Deus farão marcante diferença em sua opinião e aplicação da Palavra, em comparação aos que ainda não foram convertidos e jazem no mundo. É esta a verdade que João procura colocar diante de nós.
            5.3 Uma Confissão Vazia: em seguida, João volta sua atenção para a exposição daqueles que se identificaram com o Cristianismo, mas não têm razão para tal confiança. Suas palavras são inspiradas e seu amor inquestionável. Ele escreve: “Aquele que diz: Eu o conheço e não guarda os seus mandamentos é mentiroso, e nele não está a verdade”. Se achamos que essas palavras de João são duras e severas demais, devemos reconhecer que sua linguagem é comum no Antigo Testamento. Jesus expôs os falsos convertidos com linguagem ainda mais forte, registrada em Mateus. O apóstolo Paulo não fez diferente denunciando-os com a seguinte expressão “abomináveis, desobedientes e reprovados” (Mateus 7:23; Tito 1:16).
            E Tiago, meio-irmão do Senhor, fez referência quanto ao caráter e as obras como sendo piores do que as dos demônios (Tiago 2:19). Há duas razões para tal obstinação em face de pujantes evidências. A primeira está na natureza humana. O coração não regenerado está cheio de orgulho e toda propensão para o mal. Porém, ela ama se cobrir de um fino verniz de religião e piedade (vive de aparência e usa uma máscara, acréscimo nosso). A segunda razão para esse muro aparentemente impenetrável em volta da ilusão do falso convertido é a pregação a qual ele tem sido exposto.
            Os que professam ter fé em Cristo, mas não têm nada a ver com seguir seus mandamentos, deverão se preocupar e muito. Ainda que protestem veementemente que amam a Deus (mas O negam com suas ações), terão de ser convencidos de que as Escrituras não reconhecem essa espécie de amor, mas o denunciam como garoa insignificante.
            5.4 Nossa Segurança e os Mandamentos de Deus: 1 João 2:3 tem sido a voz clara do apóstolo nos mostrando o terceiro teste de fé colocado diante de vós: “Ora, sabemos que o conhecemos por isto: Se guardarmos os seus mandamentos”. Em suma, podemos afirmar algumas coisas quanto à pessoa realmente convertida. Primeiro, temos de confirmar a sua fraqueza. Até o santo mais maduro terá de lutar constantemente contra as distrações deste mundo e a apatia do coração em relação à Palavra de Deus.
            Segundo, apesar das reais fraquezas do verdadeiro crente, haverá notáveis diferenças ente seu relacionamento com os mandamentos de Deus e os dos não convertidos. O cristão crescerá em seu prazer aos mandamentos de Deus e fará progresso na obediência aplicadas dela. Embora haja tempo de poda e disciplina divina, haverá também vitória e frutificação. Terceiro, aumentará o lamento do cristão sobre a desobediência e crescerá o seu desejo de obedecer. Ao crescer no entendimento da dignidade de Deus e seu apreço pela Palavra de Deus, o crente sofrerá grande pesar por qualquer forma de desobediência em sua vida.
            Mas tal pesar não o levará ao desespero, porque sua peregrinação terrestre revela a fidelidade de Deus e ele sabe que o coração quebrantado e contrito Deus “não desprezará” (Salmo 51:17). Se você puder identificar as coisas que João apresentadas quanto ao novo e singular relacionamento do cristão com relação aos mandamentos do Senhor, então você terá maior razão para ter segurança de salvação. Se, porém, foi exposto seu relacionamento distante ou não existente com os mandamentos de Deus, você tem razão de grande preocupação. Precisa clamar a Deus e examinar a sua vida à luz de sua Palavra (Romanos 10:13).

Cap. 6  Imitar a Cristo.

1 João  2:5-6. Mas qualquer que guarda a sua palavra, o amor de Deus está nele verdadeiramente aperfeiçoado; nisto conhecemos que estamos nele. Aquele que diz que está nele, também deve andar como ele andou.

            Acabamos de considerar o que é possivelmente a maior evidência da conversão autêntica: obediência constante aos mandamentos de Deus. Como sabemos que conhecemos a Deus num relacionamento de salvação? A resposta é muito poderosa tanto quanto concisa: andarmos como Cristo andou!  Afinal de contas, quem ousaria imaginar, quanto mais declarar, que vive uma vida cristã igual a de Cristo quando ele andou aqui na terra?
            6.1 A Vida que Jesus Viveu: as Escrituras começam afirmando que o Filho de Deus veio ao mundo em semelhança de carne humana. O que significa dizer que, realmente e verdadeiramente ele assumiu a natureza humana, imaculada e sem pecado; contudo sujeito as mesmas limitações, fragilidades, aflições e angústia da humanidade caída (Romanos 8:3).
            William Hendriksen escreveu sobre o tema explicando desta forma: Ela assumiu essa natureza humana, não conforme ela veio originalmente da mão do Criador, mas enfraquecida pelo pecado, embora ele mesmo tenha permanecido sem pecar. (...), foi enviado a semelhança da carne humana e tomou sobre si uma natureza exposta a todas as terríveis consequências da nossa condição caída. O grande diferencial entre Cristo e os mais piedosos santos que andaram neste planeta é que (...), Cristo jamais teve um momento em sua vida que não amasse o Senhor seu Deus de todo coração, alma, mente e força. Cada feito realizado por ele teve o propósito de glorificar somente a Deus como motivação perfeita. Quer comesse, bebesse ou fizesse a tarefa mais servil, ele as fazia sempre para a glória de Deus (Hebreus 7:26; Marcos 12:30; 1 Coríntios 10:31).
Quem dentre nós poderia ficar diante de seus mais ardentes oponentes fazendo o desafio: “Quem dentre vós me convence do pecado?” Quem entre vós teria ousadia de se colocar diante das autoridades religiosas de nossos tempos e declarar: “Eu faço sempre o que lhe agrada (a Deus)”. O Novo Testamento dá testemunho não somente da vida de Cristo sem  pecado, como também da sua justiça positiva. Ele pregou aos pobres, proclamou liberdade aos cativos, recuperou a visão dos cegos e libertou os oprimidos. Não foi sem razão que as pessoas se maravilhavam completamente com ele e deram testemunho dizendo: “Tudo ele tem feito esplendidamente bem”. (João 8:29,46; Lucas 4:18; Marcos 7:37).
6.2 Como Podemos Comparar?  Poderíamos comparar a justiça ou sensatez da exigência feita por João ao escrever: “Aquele que diz que permanece nele, deve também andar como ele andou”. Por que este apóstolo amado colocaria sobre nós um fardo tão pesado que nem ele nem os outros apóstolos pudessem suportar? Seria mais fácil cumprir as penosas exigências dos Fariseus ou mesmo satisfazer as valentes demandas da própria lei do que imitar a vida perfeita de nosso Senhor (p.70-72).
Porém, antes de nos entregar ao desespero ou a perdição eterna, temos que recordar o contexto em que João escrevia esta Carta. Ele não está exigindo que se atinja um nível impossível de perfeição, mas nos encoraja a examinar a inclinação de nossas vidas. Estamos ainda andando com o curso deste mundo ou mediante a obra santificadora do Espírito, estamos aprendendo a andar como Cristo andou? Existe alguma evidência observável e prática de que buscamos imitar a Cristo? Nossa conduta diária manifesta mais de Cristo e menos do mundo? Ansiamos para ser como Cristo? (Efésios 2:13; Hebreus 2:11-12).
De acordo com as Escrituras, Cristo não é só nosso profeta, sacerdote e rei, como também nosso irmão mais velho (uma referência feita anteriormente pelo autor), e o caminho em que andou oferece tanto a direção quanto o modelo para nossa vida. O apóstolo Paulo escreve que “fomos predestinados a ser conforme a imagem de Cristo”, para que ele fosse o “primogênito entre muitos irmãos”. O apóstolo Pedro encoraja os crentes no meio de seus sofrimentos, dizendo-lhes que Cristo deixou um exemplo a ser seguido em seus passos. Finalmente, o autor da Carta aos Hebreus nos admoesta:

Hebreus 12:1-2. Portanto, nós também, pois, que estamos rodeados de uma tão grande nuvem de testemunhas, deixemos todo o embaraço, e o pecado que tão de perto nos rodeia, e corramos com paciência a carreira que nos está proposta. Olhando para Jesus, autor e consumador da fé, o qual, pelo gozo que lhe estava proposto, suportou a cruz, desprezando a afronta, e assentou-se a destra do trono de Deus.

            Não é estranho, à luz dos textos acima, que João tenha dito para “andarmos conforme Cristo andou”, como prova de conversão autêntica. Afinal, o que é o discípulo senão aquele que procura se tornar como seu mestre em todas as coisas? Na maioria dos casos, a continuação desse relacionamento de Mestre e Discípulo ocorre quando este se torna como seu mestre e se põe de pé diante dele como sendo igual.
            Porém, no Cristianismo, esse relacionamento nunca termina, pois jamais estaremos no mesmo nível de nosso Mestre. Somos sempre seus estudantes. Por esta razão Jesus acautelou seus discípulos: “Vós, porém, não sereis chamados mestres, porque um só é nosso mestre, e vós todos sois irmãos”.  O Cristão mais parecido ou mais maduro em relação a Cristo, ainda estará aprendendo a andar como ele andou. O santo mais santificado sempre verá como a si mesmo, como sendo o irmão mais novo que tenta, mas jamais conseguirá completamente caminhar nos passos do seu irmão maior (mais velho).      Sendo assim, o cristão mais maduro é consciente de que sempre haverá grande caminho a percorrer antes de obter o prêmio, isto é, a glorificação final no céu (p.73-74).
            O apóstolo Paulo expôs esta verdade com clareza surpreendente em sua Carta às igrejas de Filipos.  Ele nunca reivindicou a perfeição e nunca fingiu que andava sempre como Cristo andou. Porém, demonstrou em sua vida uma real e observável paixão de ser como Cristo “avançando e prosseguindo” para o alvo, ao ponto de poder dizer aos irmãos que estavam com ele: “Sede meus imitadores, como também eu sou de Cristo” (Filipenses 3:12-14; 1 Coríntios 11:1).
            6.3 Examinar Nossa Caminhada: estamos andando conforme a sua luz; andamos conforme ele andou? Nosso modo de viver reflete verdadeira paixão por ser como Cristo? Devemos simplesmente continuar a provar nossa confissão com a nossa conduta, crescendo em conformidade ao padrão que Cristo nos deixou. Cada dia que perseveramos servirá para fortalecer a segurança que possuímos.
Porém, (...). Se admirarmos o que o mundo admira e procuramos imitar o seu modo, devemos questionar a autenticidade de nossa profissão. As Escrituras não oferecem uma fórmula ou programa de passo a passo que conserte nossa estropiada segurança. Pelo contrário, ela nos admoesta (adverte ou avisa) a buscar o Senhor em sua Palavra e em Oração até que ele nos dê a paz.  Todas as nossas confissões de fé e os sentimentos subjetivos de segurança só serão válidos no grau em que foram provados por evidências práticas e observáveis de vida transforma e transformadora.

Cap. 7  Amar os Cristãos.
                       
1 João 2:7-11. Irmãos, não vos escrevo mandamento novo, mas o mandamento antigo, que desde o princípio tivestes. Este mandamento antigo é a palavra que desde o princípio ouvistes. Outra vez vos escrevo um mandamento novo, que é verdadeiro nele e em vós; porque vão passando as trevas, e já a verdadeira luz ilumina. Aquele que diz que está na luz, e odeia a seu irmão, até agora está em trevas. Aquele que ama a seu irmão está na luz, e nele não há escândalo. Mas aquele que odeia a seu irmão está em trevas, e anda em trevas, e não sabe para onde deva ir; porque as trevas lhe cegaram os olhos.

            O amor pelo povo de Deus é tema repetido muitas vezes, tanto no Antigo Testamento quanto no Novo Testamento. Assim, não é surpresa que João apresente esse amor como sendo prova da verdadeira conversão. Quem demonstra amor real e duradouro por seu irmão em Cristo e pela Igreja coletivamente dá poderosa evidência de conversão.
            7.1 Um Antigo Mandamento. (...): o  mandamento de Deus de amor nosso irmão tem sido tema central da sua vontade manifestada desde o início da revelação divina. Uma vez que “Deus é amor” e que amou seu povo desde o começo, não é surpresa que desde o princípio tenha ordenado que eles amassem uns aos outros. Esse mandamento não é algo que surgiu com a escrita do Novo Testamento, mas estava implícito em todas as narrativas mais antigas do Antigo Testamento e claramente revelada na Lei Mosaica, como pode ser demonstrado pela ordem registrada no livro de Levítico 19:18: “Não te vingarás, nem guardarás ira contra os filhos do teu povo, mas amarás o teu próximo como a ti mesmo. Eu sou o Senhor”.  John Gil escreve:

[Amar era] Uma parte da eterna lei da verdade, fundada sobre a inalterável natureza e eterna vontade de Deus, que é, ele mesmo, o amor, e requer isso de todas as suas criaturas. [o amor] Estava escrito no coração de Adão no estado da inocência, e era um ramo da imagem divina impressa sobre ele; e [o amor] foi entregue na Lei de Moisés, porque amar a Deus e aos Homens é o resumo e a substância dessa lei.

            De acordo com a lei, os Israelitas tinham de amar uns aos outros não se vingando nem guardando rancor; matando, roubando, cometendo adultério, dando falso testemunho ou fazendo qualquer outra coisa que impedisse o bem-estar do seu irmão. Aprendemos que o amor ao próximo é um mandamento antigo e que Deus sempre foi amor (...). A verdadeira piedade sempre se manifestou em amor a Deus e por seu povo escolhido (Êxodo 20:13-16; Levitico 19:18).
            7.2 Um Novo Mandamento. (...)? Já provamos que o amor é atributo de um Deus eterno e imutável, mandamento que prevalece e percorre todo o curso do Antigo Testamento. Como pode o mandamento ser antigo e ao mesmo tempo novo? João não se contradiz no mesmo versículo, mas utiliza essas declarações aparentemente contraditórias, para fazer uma belíssima apresentação da revelação maior da glória de Deus na nova aliança (Novo Testamento).
Deus sempre revelou seu amor aos homens desde o princípio. (...). De modo semelhante, podemos dizer que o amor ordenado, exposto e demonstrado no ensino de Cristo e sua vida sacrificial ultrapassa em muito as exigências do Antigo Testamento, de tal maneira que parece totalmente novo.
            O seu amor agora define qual profundidade, altura, largura e comprimento em que o povo de Deus deverá amar uns aos outros. Assim, Jesus ensinou aos discípulos: “Novo mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros; assim como eu os amei, que também vos ameis uns aos outros”. Na Antiga Aliança, o Israelita demonstrava amor obedecendo a leis que os protegiam, participando de numerosos atos positivos de caridade e bondade[5].
            O tipo de amor produzido pela conversão autêntica não fica restrito aos sentimentos e palavras, mas se manifesta em ações práticas, isto é, tem de haver ação. Esse tipo de amor tem de começar em meio aos relacionamentos individuais dentro da igreja local e operado (praticado) para fora dela, junto à comunidade dos que creem.
7.3 Evidência da Conversão. João assevera claramente que uma das maiores evidências de que alguém tenha se convertido (se não a maior), é o amor por seu irmão em Cristo e pela Igreja como um todo. Digo mais, esse amor deve também  ir em direção a aqueles que estão distantes de Cristo (não O conhecem ainda ou estão desviados do seu caminho), para que possam ser alcançados e, a eles, ser oportunizado a salvação eterna (acréscimo nosso).
João não procura impressionar seus leitores com a estética de sua prosa, mas espera ajuda-los a obter uma só esperança de salvação, determinando se eles possuem alguma das evidências ou virtudes que acompanham o verdadeiro Filho de Deus. (...), a obra regeneradora do Espirito Santo, que produz em nós tanto o arrependimento quanto a fé que salva, também criará em nós um novo e cada vez maior amor pelo povo de Deus. E, ainda diz que: “Nisto são manifestos os filhos de Deus e os filhos do diabo: todo aquele que não pratica justiça não procede de Deus, nem aquele que não ama a seu irmão” (João 13:35; 1 João 3:10).
O ensinamento inspirado por João, o apóstolo, é este: “Quem não ama os irmãos é filho do diabo, não conhece a Deus, não ama a Deus e habita a morte”. Ele não convida para um debate sobre a questão, nem está disposto a discutir possíveis exceções. Ele é bem taxativo: aquele que não ama os irmãos, não conhece a Deus! (p. 79-82).
7:4 A Impossibilidade de Amar. Um dos maiores testes de conversão autêntica é o amor sincero e afetivo por aqueles que pertencem a Cristo e são chamados pelo seu nome. Esse amor não é poético ou teórico, mas real e prático. É um amor que morre para si mesmo e, se necessário, arrisca tudo por amor do Nome e por aqueles que são por ele chamados. Tal amor é evidência da regeneração e verdadeira conversão, porque é absolutamente impossível à parte dela.
Desde o primeiro ato de desobediência e a resultante maldição, tem havido grande e permanente inimizade entre a semente da serpente (os filhos da desobediência) e a semente da mulher (os Filhos de Deus). Embora a guerra tenha culminado na vitória do Messias no Calvário, mas a batalha continua entre seu povo e o mundo até a consumação final. A hostilidade do mundo caído contra os filhos de Deus é uma verdade inegável da Escritura e da história. Por esta razão, João exorta seus leitores a não se surpreenderem com o ódio que o mundo tem para com eles. Jesus deu este mesmo aviso a seus discípulos no discurso do Cenáculo na noite antes de sua Crucificação (Gálatas 4:22-23; 1 João 3:13; João 15:18-19).
Quando vemos nas Escrituras a hostilidade do homem caído contra o povo de Deus, podemos entender mais claramente por que o amor pelos irmãos é uma prova tão importante da conversão. O homem natural (caído, corrompido) não consegue amar a Deus ou o seu povo. Quando alguém que antes desprezava o povo de Deus de repente se encontra partilhando dos mesmos desejos que eles e ansiando por ter comunhão com eles, é um grande indicador de que algo maravilhoso aconteceu. Essa mudança é inexplicável  a não ser pela obra do Espírito Santo da regeneração (p.84-87). Não sabemos que somos Filhos de Deus porque nosso amor é perfeito, mas porque está sendo aperfeiçoado pela obra permanente de Deus em nós (1 João 2:8; Efésios 4:13).
7.5  A Prova do Amor. Agora, precisamos examinar nossa vida à luz dessas verdades. Para nos auxiliar em ver onde estamos nesta questão de suma importância, as perguntas a seguir, podem nos ajudar. Primeiro, de quem é a companhia  em que você tem maior prazer? (...). Ou prefere a companhia do mundo e raramente fala sobre a pessoa e as coisas de Deus? Quando foi a última vez em que esteve com outros crentes com a única intenção de estar com eles e exaltar a Cristo? Devemos atentar de como responderemos a essas perguntas, reconhecendo que muito do que chamamos de comunhão cristã, tem pouco a ver com Cristo?
Segundo, você se identifica publicamente com Cristo e seu povo? Você consegue se identificar com Moisés, que “recusou ser chamado filho ou filha de Faraó, preferindo ser maltratado junto com o povo de Deus a usufruir prazeres transitórios do pecado” (1 Coríntios 4:9-13; Hebreus 11:24-25). Terceiro, embora tenha consciência das muitas fraquezas e falhas morais da igreja, você tem o compromisso de promover sua melhora? Ou se alinha com o diabo e ao mundo nas acusações contra ela? Em contraste, o verdadeiro cristão responde as falhas de seus irmãos com um amor que cobre uma multidão de pecados, e se entrega a sua restauração e aperfeiçoamento (1 Pedro 4:8). Quarto, você é membro atuante e contribuinte de uma congregação local e visível de cristãos? Você está morrendo para o seu eu e entregando sua vida em serviço ao próximo cristão? Em termos simples, o que você faz para edificar o povo de Deus e promover a causa de Cristo entre eles? (p.89)
Uma das evidências de que somos membros do corpo é que somos úteis para ele. Amor sem obras, como fé sem obras, é morto. Faríamos bem em lembrar que as ovelhas e os bodes eram divididos pelo que faziam ou não faziam para o povo de Deus. Concluindo, amar não é somente uma boa coisa entre muitas, mas a mais excelente, maior ainda que a fé e a esperança. Esta virtude tem de ser encontrada em nós e manifestada em nossas vidas (obras), antes de ousarmos assegurar ao nosso coração que o temos conhecido (Tiago 2:17; Romanos 3:12; Oséias 3:1-3; 1 Coríntios 13:13; 1 João 3:14).

Cap. 8  Rejeitar o Mundo.

1 João 2:15-17. Não ameis o mundo, nem o que no mundo há. Se alguém ama o mundo, o amor do Pai não está nele. Porque tudo que o que há no mundo, a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida, não é do Pai, do mundo. E o mundo passa, e a sua concupiscência; mas aquele que faz a vontade de Deus permanece para sempre.

            Nos capítulos anteriores, consideramos diversas evidências de vida cristã: andar de conformidade a revelação de Deus; confessar o pecado; guardar os mandamentos; imitar a Cristo e amar nossos irmãos. Neste capítulo, acrescentamos mais uma marca à luta: a perseverança do crente e sua crescente rejeição ao mundo.
            8.1  (...) O Que é Mundo e no que consiste o mundo? Esta expressão “mundo” é traduzida da palavra grega Kósmos. (...), ela pode referir-se ao universo físico ou a seus habitantes humanos. Porém, neste contexto e em muitos outros, a palavra cosmos carrega uma distinta conotação negativa. Ela se refere a tudo no âmbito de nossa existência humana que é contrário ao conhecimento de Deus, que está em oposição a vontade d’Ele e é hostil para com a Sua pessoa. Consistem em ideais, aspirações, filosofia, atitude e conduta da grande massa da humanidade caída. (...), o mundo nada mais é do que a soma de três elementos básicos ou vis: a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida.
            8.2 A Concupiscência da Carne. Esta palavra origina-se do grego Epithumía, que denota desejo, anseio, paixão ou almejo (desenfreado, sem equilíbrio, acréscimo nosso). Ela não é necessariamente negativa, mas pode assumir essa conotação dependendo do contexto em que é empregada[6]. De forma positiva, podemos observar seu uso em alguns textos. Jesus desejava ardentemente comer a Páscoa com seus discípulos. O apóstolo Paulo tinha imenso desejo de ver o rosto dos Tessalonicenses, entre outros. No entanto, quando nos referimos ao seu uso no Novo Testamento, ela é mais frequentemente empregada para denotar cobiça ou forte desejo que se encontra fora do âmbito da vontade de Deus, tanto na direção quanto em relação a sua intensidade (Romanos 11:12; Lucas 22:15; 1 Tessalonicenses 2:17).
            O apóstolo Paulo usou essa palavra para descrever o pecado de cobiçar ou ansiar por aquilo que é contrário a vontade de Deus. Pedro a utilizou para descrever os desejos corruptos de homens carnais, que desprezavam a autoridade e viviam em oposição a Deus. A palavra “carne” vem do vocábulo hebraico “Basar” e da palavra grega “Sarx” (p.92).
Dependendo do contexto ela tem diversos significados. Primeiro, pode denotar o corpo físico comum de um homem; sua carne, sangue e ossos. Segundo, pode se referir ao homem como criatura fraca e temporal, especialmente em comparação com Deus, que é eterno e onipotente Espírito. Terceiro, pode denotar a condição decaída do homem ou a depravação moral de sua natureza no seu estado não regenerado (Romanos 7:7-8; 2 Pedro 2:18; 2 Coríntios 10:3; Gálatas 2:20; Filipenses 1:22).
Neste contexto, é a terceira significação que está sendo dada por João. O homem, apogeu da glória de Deus, foi feito a sua imagem e para sua glória. Quer coma, beba ou faça qualquer tarefa, da mais nobre a mais humilde, tem de realiza-la para a glória de Deus. (...), as Escrituras testificam que ela pecou e está destituída dessa glória – o homem se deslocou e se deformou. De acordo com as Escrituras, o homem natural vive na cobiça da carne e cede (se entrega) a seus desejos. Ele é filho da ira por natureza (Romanos 3:23; 1 Coríntios 10:31; Efésios 2:3). 
A pessoa que continua escravizada e impelida pelos desejos pecaminosos da carne ainda não conhece a Deus, apesar de sua profissão de fé e reivindicação de possuir a identidade de Cristo. Porém, a pessoa que crucificou a carne com suas paixões e desejos, e que anda na liberdade do Espírito de Deus, tem grande razão pela esperança de que se tornou Filho de Deus (Gálatas 5:16,24-25).
8.3 Concupiscência dos Olhos. Grande parte dos comentaristas, tanto os antigos quanto os contemporâneos, concorda que esta frase se refere aos desejos pecaminosos ativados e alimentados por aquilo que vemos. É por meio dos olhos que somos levados a cobiçar as coisas que o amor e a justiça de Deus condenam ou proíbem. Foi assim lá no Éden;  Eva viu que a árvore proibida era “agradável” aos olhos (p.94).
Acâ viu e cobiçou uma “bela capa, moedas de prata e barras de ouro” entre os despojos proibidos. O rei Davi viu a beleza de “Bateseba” do telhado de seu palácio, desviando-se da lei e a tomou por mulher (Gênesis 3:6; Josué 7:20-21; 2 Samuel 11:2-5).
Ao considerarmos esses textos, podemos achar que o pecado dessas pessoas estivesse em seus atos, mas, na verdade, eles pecaram muito antes de cometê-los. O próprio Jesus advertiu-nos sobre isso ao dizer que “aquele que olhar para uma mulher com intenção impura no coração, já adulterou com ela”. Jó sabia da grande seriedade e gravidade desse pecado e, por esta razão, declarou “tenho feito uma aliança com meus olhos de não olhar para uma virgem”, isto é, jovem mulher (Mateus 5:27-28; Jó 31:1).
Todas as Escrituras testificam o que Charles Haddon Spurgeon explicou com toda clareza:

“Aquilo que fascina o olho é muito apto a obter admissão no coração, assim como a maça de Eva agradou primeiramente a sua visão e então prevaleceu sobre sua mente e mão”.

            No Sermão do Monte, Jesus extraiu da Literatura Judaica se referindo ao olho como sendo a “lâmpada do corpo”. A ideia é que o foco do olho da pessoa revela o conteúdo e a condição do seu coração. A pessoa que resolveu desviar seus olhos do mal e enfocar (fixar) o reino dos céus demonstra que seu coração se tornou reto por meio do evangelho e da obra regeneradora do Espírito Santo. Em contrapartida, aquele que não consegue enxergar a beleza ou o benefício do reino, mas firma seus olhos sobre as coisas deste mundo, demonstra que seu coração permanece não regenerado e que o evangelho pouco fez bem a ele (p.96).
            Precisamos estar atentos, haja vista que vivemos momentos e circunstâncias de uma cultura totalmente hipnotizada por coisas malignas e os marqueteiros de “plantão”, sabem muito bem que com um único efeito visual conseguirão despertar nossos corações ao desejo e anseio por coisas que outrora não conhecíamos ou nem desejávamos. O diabo sabe desde o começo que a maior e mais larga avenida que leva ao coração são os olhos. Se o coração for verdadeiramente regenerado, você é uma nova criatura, com novos afetos (e atitudes) que dirigirão seus olhos para longe da atração mundana até aquilo que é celestial.
            8.4 A Soberba da Vida. Estra frase é traduzida do grego “Alazonéia tou bíou”. A palavra alzonéia é corretamente traduzida como sendo “orgulho soberbo”. Ela se refere a um orgulho vazio, presunçoso e insolente, que conduz a um palavreado de jactância. Ela é empregada na forte advertência de Tiago aos ricos que se gabavam de grandes planos e empreendimentos á parte de Deus, sem considerar a sua providência ou a sua própria mortalidade (Tiago 4:13-16).
            Quanto a outra expressão “Bíou”, o Novo Testamento usa duas palavras da língua grega para representar seu significado como sendo “vida”. A mais comum é Zoé que se refere ao princípio ou essência da vida. Entretanto, a outra palavra é Bio,s de onde se origina a palavra Biografia. Ela tende a se referir ao período ou decurso de vida da pessoa ou aquilo pelo qual a vida da pessoa é sustentada: recursos, riqueza, propriedades ou sustento.
            Juntando o que sabemos sobre essas duas expressões e seu uso no Novo Testamento, concluímos que a frase traduzida é “Soberba da Vida”, referindo-se ao orgulho ou arrogância de pessoas que não só se gabam (vangloriam-se) do que conseguiram ou possuem como também os atribuem à sua própria sabedoria e poder (esforços). A mesma atitude floresce facilmente entre aqueles que confessam depender de Deus e até mesmo daqueles que dão graças a Ele.
            Existe um ateísmo prático na igreja que é muito mais mortal do que seu irmão mais velho e mais abertamente desafiador. Veste roupa do cristianismo e pode até mesmo confessar a Jesus com Senhor, mas raramente consulta Sua vontade em nível prático. Pode pedir a Deus que se junte a ele num propósito, que já foi determinado um plano totalmente designado (p.99).
            A soberba da vida é a epítome[7] da adoração de si mesmo e os que cedem a isso se tornam patéticos, tanto quanto os antigos Caldeus (Babilônicos) que ajuntavam os peixes em suas redes para então oferecer sacrifícios a eles. Tais pessoas não conseguem enxergar que Deus é que dá vida a todas as pessoas, respiração e todas as coisas para que possam busca-lo e encontra-lo (Habacuque 1:15-16; Atos 17:25-27; Salmo 39:5; Isaías 2:22; Tiago 4:14).
            8.5 Nossa Relação com o Mundo. À luz do que aprendemos como pessoas que professam ser cristãos, temos de nos perguntar onde estamos em relação ao mundo? Ela é uma das grandes provas de nossa salvação. João nos adverte que o amor ao mundo e o amor a Deus são diametralmente opostos: “Se alguém ama o mundo, o amor do Pai não está nele”. Tiago é mais ousado ao declarar que: “Infiéis, não compreendeis que a amizade do mundo é inimiga de Deus”? (1 João 2:15; Tiago 4:4).
            Segundo as Escrituras, amar o mundo e amar a Deus ao mesmo tempo é uma impossibilidade lógica, porque os dois são totalmente incompatíveis e opostos entre si. Isso não quer dizer que os cristãos não tenham problemas ou dificuldades com o mundo, nem que sejam por ele seduzidos. Ele terá grandes lutas com o mundo em todas as suas variadas manifestações, mas o odiará.
            A pessoa que professa ter fé em Cristo e se encontra crescendo em seu desdém pelo mundo, vivendo em oposição a ele, progredindo na sua vitória sobre o mundo, tem grande causa de segurança, não importa quantas vezes tenha caído. Assim permanece a pergunta: onde estamos em relação ao mundo?
            8:6 Uma Palavra para os Pastores. Nos dias de João, o mundo tinha seu ápice no Império Romano, com sua avareza, sensualidade e fome de poder. No apocalipse ele é visto como “Babilônia, a Grande, a Mãe das Meretrizes e das Abominações da Terra”. Como a babilônia da antiguidade, o mundo de hoje estende seu copo dourado para todos beberem: “um cálice transbordante de abominações e com as imundícias da sua prostituição” (Apocalipse 14:8; 17:4-5).  N
            Também como a babilônia, o mundo hodierno está armado de falsos profetas enviados aos quatro cantos do globo para desviar a humanidade. (...). Não ligam para os absolutos morais que podem impedir a liberdade do individuo em sua busca de auto expressão. Estão sempre do lado de seus ouvintes como seus corretores, procurando os interesses, dizendo-lhes o que precisam e tornando isso disponível a determinado preço. Não é difícil discernir por que eles têm tantos seguidores (p.102).
            O mundanismo não requer grande explicação, mas o que está longe de entendimento é a ousada presença do mundo na igreja. (...). Por que e como isso tem acontecido em tantas igrejas?  Primeiro, temos de concluir que grande e inquietante número deles (membros, pastores etc.) não são regenerados, e assim, estão cortados de Cristo. Suas flagrantes e impensadas violações da doutrina e da ética são tão grotescas que certamente não são convertidos. Segundo, temos de conceder que alguns que são realmente convertidos não foram chamados.
Terceiro, temos de entender que alguns homens realmente são cristãos e chamados ao ministério evangélico, mas foram enredados pela religião do dia; falta-lhes o “ferro que afia o ferro” da verdadeira comunhão com outros homens de Deus, mas não sabem como encontrar o caminho de volta (Provérbios 27:17). 
Quarto, muitos pastores têm se envolvido na tendência de “fazer” a igreja de acordo com os caprichos da cultura ou a suposta efetividade do pragmatismo. Muitos assumiram os maneirismos de apresentadores de show , coaching de vida, psicanalista ou especialista de marketing. Não podemos esquecer que os pastores são principalmente estudantes e mestres das Escrituras; cuidadores do rebanho e ardentes intercessores diante de Deus. (...). Deverão se conformar a rigorosos padrões da Escritura quanto ao caráter, ética e dever (1 Timóteo 3:1-7; Tito 1:7-9).
Quinto e último, devemos reconhecer que somos covardes – medo de rejeição que flui do ídolo da autopreservação. Temos desenvolvido uma visão distorcida e conveniente do amor que jamais perturba a ninguém. (...). É um amor que deixa as pessoas andarem rumo ao inferno sem adverti-las, em vez de confrontá-las em seus pecados, ferindo sua frágil autoestima ou tornando-as inimigas ao dizer-lhes a verdade (Gálatas 4:6).
Isso não é amor, mas a antítese do amor. Se nunca repreendemos as ovelhas para ganhar injustamente seu desfavor, não é porque os amamos, mas porque queremos que elas gostem de nós. (...). Esquecemo-nos da advertência do Senhor que disse: “Ai de vós, quando todos vos louvarem! Porque assim procederam seus pais com os falsos profetas” (Lucas 6:26).

Cap. 9  Permanecer na Igreja.

1 João 2:18-19. Filhinhos, já é a última hora[8]; e, como ouvistes que vem o anticristo, também, agora, muitos anticristos tem surgido, pelo que conhecemos que é a última hora. Eles saíram de nosso meio, entretanto, não eram dos nossos; porque, se tivessem sido dos nossos, teriam permanecido conosco; todavia, eles se foram para que ficasse manifesto que nenhum deles é dos nossos.

            Neste texto, o apóstolo João faz referência a um grupo de pessoas que se apostataram da fé. Eles haviam rejeitado a doutrina apostólica sobre a pessoa e as obras de Cristo abandonaram a igreja e se tornaram falsos profetas. João, inclusive, chega a referir-se a eles como anticristos. Esse titulo infame “anticristo”, é a junção das palavras grega Christós (Cristo) e a preposição “anti” que literalmente significa “contra” ou “em lugar de”.
            No singular, o anticristo se refere ao grande inimigo do Messias, que um dia tentará usurpar (arrancar ou tirar a força) seu lugar lutando contra Jesus Cristo. No plural, ele se refere a qualquer número de pessoas de todas as eras da igreja, que negam as doutrinas apostólicas fundamentais sobre a pessoa e a obra de Cristo, colocando-se fora da igreja e do cristianismo histórico e que buscam desviar outras pessoas do mesmo modo (2 Tessalonicenses 2:3-4).
            Em sua Epístola, João descreve estas pessoas como sendo mentirosas e enganadoras, pois negam o Pai e o Filho, rejeitando a encarnação e recusando a reconhecer que Jesus é o Cristo divino. Em nossos dias, o mundo está repleto de anticristos que se opõem a Cristo diretamente ou então propagam uma religião que diminui a supremacia de Sua pessoa ou a natureza essencial de sua obra. A própria Escritura revela que “os que não são por Cristo estão contra ele” (Lucas 11:23; 1 João 2:22-23; 2 João 1:7).
            9:1 Segurança e Apostasia: (...), espero apresentar algumas importantes verdades quanto à natureza da conversão e demonstrar como elas se aplicam ao cristão. Para começar, é necessário entender que eu afirmo a doutrina histórica da perseverança dos santos (o autor), conforme atestavam os Reformadores, os Puritanos, os Presbiterianos tradicionais e os Batistas Reformados[9].
            A doutrina acima referida, afirma que aqueles que foram verdadeiramente regeneradas pelo Espírito Santo, feitos novas criaturas em Cristo, guardados pelo poder de Deus, nunca permanecerão caídos na apostasia e destruição eterna. A razão para tal confiança não é fundamentada sobre a força de vontade do cristão, mas somente sobre a fidelidade e o poder de Deus. O mesmo Deus que salva o seu povo, também os guarda por seu poder.
            O Deus que justifica o crente com certeza o santificará e, no final dos tempos, o levará a glorificação (nos céus). Como escreveu o apostolo Paulo em uma de suas Cartas: “Estamos confiantes de que aquele que começou boa obra em nós a aperfeiçoará até o dia de Cristo Jesus” (Filipenses 1:6).
            Em qualquer discussão sobre a perseverança do crente; quatro coisas devem ser consideradas: primeiro, temos de compreender algo sobre a natureza de salvação. A superficialidade de grande parte da pregação contemporânea nos leva a crer que a obra da salvação seja primariamente uma decisão da vontade humana. Deus revela o evangelho ao homem e então espera sua resposta (ou seja, sua decisão). O homem recebe a salvação por sua decisão de seguir a Cristo e continua nessa salvação pelo mesmo ato de vontade.
            O problema desse ponto de vista é que trata somente da vontade do homem e não considera a operação de Deus sobre a sua natureza. A Escritura ensina que a pessoa que crê para a salvação é nascida de Deus[10]. Além do mais, afirma que nesse novo nascimento “não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus”. Portanto, a salvação não envolve apenas um ato de vontade humana, mas a transformação de uma natureza radicalmente depravada para uma nova criação (João 1:13; 2 Coríntios 5:17).
            Segundo, temos de compreender algo da obra contínua da providência divina na vida dos verdadeiramente convertidos. Deus não apenas incita a pessoa a crer  para então deixa-la fazer aquilo que ela quer fazer. As Escrituras nos ensinam que o Deus que justifica, é também quem santifica. Esta verdade é demonstrada de modo supremo na Epístola de Paulo endereçada à Igreja de Éfeso. A pessoa que foi justificada pela graça mediante a fé torna-se feitura de Deus. Ela foi recriada em Cristo Jesus para realizar o bem que foi preparado para ela antes da fundação do mundo, segundo os eternos conselhos de Deus.
            O apóstolo Paulo também escreveu aos cristãos de Filipos, afirmando que Deus não os salvou para então deixa-los a sós, sem rumo, mas está trabalhando neles “tanto o querer quanto o realizar, segundo a sua boa vontade”. Esta declaração prova que Deus não apenas tornou o crente em nova criatura, com novo afeto a influir sobre sua vontade, como também opera sobre a vontade do cristão para que ele viva e trabalhe de acordo com a boa vontade de Deus.
            Terceiro, (...). Embora a obra de Deus de salvação seja para o homem, o bem estar do homem não é seu alvo principal ou bem maior. O fim de todas as coisas é a glória de Deus mediante a revelação de seu caráter e poder. Noutras palavras, Deus faz tudo que faz a fim de que sua grandeza e glória sejam reveladas às suas criaturas. Este é o propósito de todas as obras de Deus, mas especialmente de sua maior obra: a salvação do homem por meio de Jesus Cristo. Será que Deus deixaria que fracassasse a maior demonstração de seu caráter e poder?  Para sua glória, Deus não permitirá que a salvação falhe, nem mesmo para o mais fraco que crê. Porém, ele “fará com que a força do meu Senhor se engrandeça como tens falado”. Tomará seu povo do mundo e os conduzirá para si mesmo. Purificará de toda sua imundícia e ídolos e lhes dará um novo coração em que escreverá suas leis. Porá neles o seu Espírito e fará com que andem em seus estatutos (Números 14:17; Jeremias 31:33; 32:38-41; Ezequiel 36:22-27).
            Portanto, a salvação não fracassará, pois não foi projetada para provar ou revelar nossa fidelidade e poder, mas sim o poder e a fidelidade de Deus. Quarto, precisamos entender que a doutrina da preservação dos santos (salvos), tem sido grosseiramente obscurecida e exposta de maneira errônea por muitos dos que dizem crer nela. A doutrina histórica da perseverança dos salvos afirma a segurança eterna do filho de Deus.       Porém, isso não é licença para o pecado, nem sustenta que pessoas ímpias e carnais serão salvas. Pelo contrário, sem vacilar, mantém as verdades Bíblicas de que somente os que perseverarem até o fim serão salvos, e que sem a santificação que conduz a santidade, ninguém verá o Senhor (Mateus 24:13; Marcos 13:13; Hebreus 12:14).
            O evangelicalismo contemporâneo tem sido afetado totalmente por um ensino de que “uma vez salvo é salvo para sempre” que argumenta a possibilidade de salvação sem santificação. No nome de defender as doutrinas da sola gratia (somente a graça) e sola fide (somente a fé), muitas pessoas evangélicas de liderança da igreja argumentam apaixonadamente pela salvação de uma pessoa que uma vez professou crer em Cristo, mas agora O nega ou continua professando ter fé em Cristo, mas permanece carnal, mundano e apático em relação a Deus.
            Aqueles que assim professam e defendem, demonstram total ignorância da natureza da fé, do  poder da regeneração e da divina promessa de uma obra contínua da providência. (...). As Escrituras nos dão a promessa de que se com nossa boca confessarmos que Jesus é o Senhor, e se crermos em nosso coração que Deus o ressuscitou da morte, seremos salvos. Não podemos esquecer de que a salvação é vista em três tempos e que Deus é o autor e aperfeiçoador de cada um: 1º - Ele nos salvou da condenação do pecado e da morte pela justificação; 2º - atualmente Ele está nos salvando do poder do pecado pela santificação progressiva e; 3º - e Nos salvará dos efeitos e da presença do pecado pela nossa futura glorificação nos céus.

Romanos 8:28-31. E sabemos que todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus; daqueles que são chamados segundo o seu propósito. Porque os que dantes conheceu também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que predestinou a estes também chamou; e aos que chamou a estes também justificou; e aos que justificou a estes também glorificou. Que diremos, pois, a estas coisas? Se Deus é por nós, quem será contra nós?
           
            Portanto, como assevera o apóstolo Paulo, descrito no texto acima, esta não é apenas uma possibilidade esperançosa na vida do cristão, mas de absoluta certeza.            

            9:2  Exame Pessoal. Cristãos autênticos não caem. Porém, muitos que confessam e que se identificam com a igreja não são crentes autênticos. Acabam se desviando da igreja Bíblica e demonstram sua verdadeira condição. Nesta questão, a igreja tem falhado com a maioria de seus congregados. Quando a Palavra de Deus não é exposta de modo a afetar a consciência e quando a igreja é organizada para satisfazer os desejos carnais do mundo, então os não convertidos não são compelidos a sair, mas permanecem confortavelmente na igreja enquanto continuam rumo ao inferno. Este é o triste estado do que acontece na chamada igreja evangélica.
            Se for haver mudança, ela tem de começar com um reavivamento entre a liderança, ou seja, os pastores do povo de Deus. Estes, precisam pregar todo o  Evangelho da Palavra de Deus à consciência de seus ouvintes. Tem que tornar conhecido o evangelho em toda sua escandalosa glória, expondo a santidade de Deus, a depravação do home, apontando para a cruz do Calvário e ordenando aos homens em todo lugar que se arrependam e creiam no evangelho.
            Precisam instar o povo de Deus a buscar uma vida de santidade, desdém (ojeriza) pelo mundo, desinteresse por si mesmo, serviço sacrificial tendo sempre em vista a eternidade. É necessário despertar do sono os não convertidos entre nós. Certos de que alguns acordarão com ódio do pregador (pastor) e sua mensagem, mas outros despertarão quebrantados ante o pecado e tendo fé para a vida eterna.

Cap. 10  Confessar Cristo.

1 João 2:22-24. Quem é o mentiroso, senão aquele que nega que Jesus é o Cristo? Este é o anticristo, o que nega o Pai e o Filho. Todo aquele que nega o Filho, este não tem o Pai; aquele que confessa o Filho tem igualmente o Pai. Permaneça em vós o que ouvistes desde o princípio. Se em vós permanecer o que desde o principio ouvistes, também permanecereis vós no Filho e no Pai.
(...)
1 João 4:1-3. Amados, não deis crédito a qualquer espírito; antes, provai os espíritos se procedem de Deus, porque muitos falsos profetas tem saído pelo mundo afora. Nisto conhecereis o Espírito de Deus: todo espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne é de Deus; e todo espírito que não confessa a Jesus não procede de Deus; pelo contrário, este é o espirito do anticristo, a respeito do qual tendes ouvido que vem e, presentemente, já está no mundo.

            O propósito da primeira Epístola de João é auxiliar os crentes a adquirir uma segurança Bíblica com respeito a seu relacionamento com Deus por meio de Cristo e seu estado eterno. Porém, falsos mestres haviam entrado na congregação e estavam criando dúvidas quanto a algumas verdades fundamentais do Cristianismo.
            Dos textos em destaque acima, colocaremos em relevo alguns desses erros que estavam sendo propagados por esses falsos mestres: primeiro, eles negavam que Jesus fosse o Cristo; segundo, negavam também que Jesus Cristo tinha vindo em carne; e, terceiro, negavam que Jesus Cristo fosse o Filho de Deus.
            Das três negações acima, dentre outras evidências descritas nesta Carta, parece que esses homens eram agnósticos[11] ou pelo menos seus ensinamentos representavam os estágios iniciais da religião (seita) que acabou sendo conhecida como gnosticismo. As duas expressões são derivadas da palavra grega “gnoses”, que significa conhecimento.
            Os gnósticos alegavam possuir um conhecimento especial que se originava fora das Escrituras, era contrário a ela.  Seu ensinamento central era que o espírito era bom e a matéria era má (carne, corpo).  Desse dualismo nada Bíblico, resultaram diversos erros fatais, tornando o gnosticismo uma das mais perigosas heresias que a igreja primitiva confrontava. Na filosofia, o dualismo se refere a qualquer sistema de pensamento que considere a realidade em termos de dois princípios independentes – material ou imaterial, ou matéria e espírito.
Segundo eles, primeiro, o corpo humano era material e, portanto, mau. Em contraste, Deus era puro espírito e, portanto, bom. Segundo, para ser salvo a pessoa tinha de fugir do corpo, não pela fé em Cristo, mas por especial revelação que somente os gnósticos conheciam.
            Terceiro, com o corpo era mau, alguns gnósticos afirmavam que ele deveria ser privado por meio de um estilo de vida ascético[12]. Porém, outros afirmavam que o corpo não era importante e, portanto, podiam ceder sem restrições a qualquer forma de imoralidade. Muitas dessas e outras heresias são tratadas por João na sua primeira Epístola, assim como faz também o apóstolo Paulo no Livro de Colossenses. Neste caso, duas heresias são de interesse especial em nosso estudo; são elas: o Docetismo[13]  e o Cerintianismo.
            O Cerintianismo  recebeu esse nome, devido o seu proeminente porta voz se chamar – Cerinto. Ele ensinava que o espírito do divino Cristo desceu do céu sobre o homem Jesus de Nazaré no momento de seu batismo e que Cristo abandonou a Jesus e ascendeu aos céus antes de morrer no Calvário. Em suma, o ensino gnóstico negava a encarnação do eterno Filho de Deus e dizia que o homem Jesus e o Cristo, eram dois entes separados; negando assim que Jesus fosse o Cristo, Filho de Deus.
            A explicação contemporânea de tudo isso que aprendemos é simplesmente esta: uma pessoa não é cristã a não ser que creia e confesse que Jesus de Nazaré é o eterno Filho de Deus. Que ele deixou de lado sua glória celestial e foi concebido pelo Espírito Santo no ventre de uma virgem; que nasceu em Belém como Deus encarnado. Que é plenamente Deus e plenamente homem. Que era o Cristo predito pela lei e pelos profetas, e que ele é o Salvador do mundo. Portanto, qualquer desvio dessas verdades essenciais quanto a pessoa de Jesus Cristo, desqualifica qualquer confissão Cristã (de fé) assim chamada, não obstante, sua aparente sinceridade e zelo por boas obras.
            10:1 O Que Você Pensa de Cristo? (...), o cristianismo trata da pessoa e obra de Jesus Cristo. Se a igreja evangélica estivesse mais saudável ou pelo menos mais focada nas Escrituras, essa declaração não seria necessária. Porém, é necessária e deverá ser o tema constante de toda pessoa da igreja que deseja reforma e reavivamento.
            O cristianismo em sua forma mais verdadeira e mais primitiva é uma religião fundamentada e enfocada em Cristo: “Porque ninguém pode lançar outro fundamento, além do que já foi posto, o qual é Jesus Cristo” (1 Coríntios 3:11). Nada em todas as nossas confissões, identificações ou obras terá algum valor ou utilidade se primeiramente nós não tivermos uma opinião correta a respeito de Cristo.
            Dois aspectos da pessoa de Cristo são apresentados nas Escrituras com tamanha clareza que negá-las seria negar as Escrituras e tornar-se anticristo. A primeira é que (...). O redentor tinha de ser homem, pois foi o homem que transgrediu a lei e, por isso, teria de morrer. O redentor tinha de vir de nossa estirpe – carne da nossa carne e osso de nossos ossos. Para que Cristo fosse nosso “parente remidor”, tinha de ser da nossa espécie (Hebreus 10:4; Levítico 25:25; Rute 2:1, 20).
            Nesse sentido, citaremos três razões para a necessidade de ter de ser Cristo: Primeira, somente Deus é salvador e ele não compartilha e nem divide este título com mais ninguém. Deus reivindicou a redenção como sendo prerrogativa da divindade ao declarar por intermédio do profeta Isaías: “Eu, eu sou o Senhor, e fora de mim não há salvador” (Isaías 43:11).
Segunda, a magnitude da obra da redenção exigia a divindade. A criação do nada[14] requereria gênio e poder muito além de tudo que pudéssemos imaginar. Contudo, era algo pequeno se comparado à nossa redenção. Não foi necessário nenhum esforço ou sacrifício da parte de Deus para criar um mundo do nada. Ele descansou no sétimo dia, não para se recuperar, mas para ter prazer em algo obtido – um novo mundo bom e belo tirado do nada por meio de uma só palavra.
Terceira, nossa total depravação exigia que nosso redentor fosse Deus. Isso prova que necessitamos mais que remédio humano ou guia moral. Precisamos de Deus!  Qualquer pessoa que pense que para ser salvo por alguém menor do que Deus, não tem entendimento da profundidade de sua própria depravação e quebra da lei. Se fizermos uma avaliação honesta de nós mesmos – nossos pensamentos mais íntimos, escondido, palavras proferidas em segredo, seriamos humilhados e envergonhados conformem convém. (...).
Se apenas parássemos de ignorar ou de fazer revisões históricas para considerar os pecados de nossos pais, descobriríamos que propagamos os seus pecados de forma modificada e mais sofisticada. (...). Precisamos de Deus contra o qual pecamos para pagar o preço por nossa redenção. O Deus que nos criou tem de ser o Deus que nos recria.
10:2 Quem Você Diz Que Ele é?  Esta pergunta, em determinado momento de seu ministério terreno, ele a fez aos seus discípulos: “Quem diz o povo ser o Filho do Homem?” O apóstolo Pedro respondeu: “Tu és o Cristo! o Filho do Deus vivo” (Mateus 16:13-17).
Tal verdade, combinada ao que juntamos de 1 João 4, nos instrui que se cremos que o homem Jesus seja qualquer coisa menor que Cristo e Deus encarnado, não somos cristãos. A igreja verdadeira está repleta de toda espécie de crente: maduros e imaturos; acadêmicos e trabalhadores mais simples; mestres e estudantes. Admite-se que alguns são mais cultos que outros quanto ás grandes verdades da pessoa de Cristo e mais hábeis na exposição das mesmas.
No entanto, mesmo o mais destreinado entre o povo de Deus crê na verdade de que Jesus é a única pessoa da história, o Filho eterno de Deus, que se fez carne e habitou entre nós (João 1:14; Hebreus 2:14).  A marca distintiva de qualquer religião fora do Cristianismo e de toda seita que diz se identificar com o cristianismo, é a negação sobre alguma coisa a respeito da pessoa de Cristo. (...). Mesmo aqueles crentes que se encontram nos lugares mais remotos do mundo têm um entendimento primitivo, mas certo de que Cristo é ambos: Deus e Homem.
Embora eles possam não saber explicar como essas duas naturezas existam numa só pessoa, sem confundir nem diminuir qualquer das duas, sabem que Jesus é divino e humano no senso mais completo dos termos e recusam a ter comunhão com os que ensinam de outra maneira. Há pouca evidência de que uma pessoa tenha sido ensinada por Deus se ela pensa de Cristo de maneira contrária as Escrituras.
Há pouca evidência de que uma pessoa sido regenerada pelo Espírito Santo se as grandes verdades a respeito de Cristo não inspiram mais amor, reverência e devoção prática. (...), a regeneração sempre conduzirá ao pensamento correto a respeito de Cristo e correspondente afeto por ele.

Cap. 11 Purificar a Si Mesmo.

1 João 3:1-3. Vede que grande amor nos tem concedido o Pai, a ponto de sermos chamados filhos de Deus; e, de fato, somos filhos de Deus. Por essa razão, o mundo não nos conhece, porquanto não o conheceu a ele mesmo. Amados, agora, somos filhos de Deus, e ainda não se manifestou o que havemos de ser. Sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele, porque haveremos de vê-lo como ele é. E a si mesmo se purifica todo o que nele tem esta esperança, assim como ele é puro.
            omHJoHJ
           
            Neste texto, João volta a atenção para a grande importância da pureza moral na vida cristã. Suas palavras, cuidadosamente elaboradas, demonstram que a pureza não é apenas uma opção para o cristão, mais uma das maiores evidências da conversão. Sabemos que realmente fixamos nossa esperança para a salvação sobre Cristo, se nossas vidas forem marcadas por uma busca por santidade pessoal – se procuramos nos purificar como ele é puro.
            Este texto enfatiza, entre outras coisas, sobre os falsos mestres que se infiltraram na igreja e acreditavam que o corpo físico era mau e de pouca consequência nas questões religiosas. Assim, eles se entregavam aos desejos carnais e ensinavam outros a fazerem o mesmo sem reservas. A vida deles era marcada pelo amor pelo mundo “a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida” (1 João 2:15-16).
            Em nome da graça, as pessoas ignoram, reinterpretam ou negam de cara os mandados Bíblicos quanto á santidade. Os que lutam por maior santidade ou pureza pessoal mais refinada, frequentemente são rotulados de fanáticos, legalistas, superespirituais ou mais-santo que Deus. Embora a pureza pessoal nunca seja completa deste lado da glória, e embora este não seja um meio parar obter uma boa situação diante de Deus, ela é grande evidência de que a pessoa conhece a Deus pela obra regeneradora do Espírito Santo e fé em Cristo. Os que foram salvos pela graça mediante a fé se tornaram feitura de Deus. Essa feitura é manifesta na conformidade do crente ao caráter de Deus, do qual a marca mais distintiva é a santidade: “(...): Sede santos, porque eu sou santo” (1 Pedro 1:16; 1 João 3:3).
            (...) ou instruídos na verdade de que uma das grandes marcas de conversão é um anseio por pureza pessoal, que conduz a uma busca autêntica e repetitiva por ela. Inconscientes de que “sem a santidade, ninguém verá o Senhor” (Hebreus 12:14).
            11:1  Visão Cristã da Pureza. “(...). E a si mesmo se purifica todo os que nele tem esta esperança, assim como ele é puro” (verso 3). As expressões “puro” e “purifica” derivam da mesma raiz grega. O adjetivo puro é traduzido da palavra grega Hagnos, denotando que a pessoa ou coisa seja pura, santa, casta ou inocente. Já o verbo purificar é traduzido da palavra grega Hagnizo, com o significado de tornar puro, purificar ou limpar.
            O Novo Testamento usa essa palavra com referencia a purificação cerimonial.  Ela também denota uma limpeza interna e pessoal. Tiago escreve aos cristãos espalhados da igreja primitiva, conclamando que os pecadores limpem suas mãos e purifiquem seus corações para que se acheguem a Deus (João 11:55; Atos 21:24,26;Tiago 4:8).
            No texto em apreço, o apóstolo João descreve o crente autêntico como quem purifica a si mesmo, assim como Cristo é puro. O verbo que ele emprega está no presente, indicando uma ação contínua. Daqui aprendemos que o avanço do cristão em pureza pessoal não é necessariamente o resultado de alguma experiência momentânea, mas um processo que continua desde o momento da conversão até a glorificação final no céu. É por isso que os teólogos e expositores muitas vezes se referem ao crescimento do crente na pureza como santificação progressiva. (...), esse crescimento em santidade do crente é, sobretudo, resultado da obra da providência progressiva de Deus e a luta dia a dia do crente em busca de maior pureza mediante a Palavra de  Deus, oração e reprovação do mundo por Deus.
            Purificação ou santificação é um trabalho sinergético, ou seja, ocorre uma interação ou cooperação entre dois ou mais agentes para produzir um efeito conjunto. Neste caso, Deus e o Cristo participam ativamente para alcançar o alvo desejado: a conformidade do crente à imagem de Cristo. A iniciativa e participação de Deus garantem ao cristão avanço em santidade. Ao mesmo tempo, as Escrituras reconhecem que a santificação do crente depende também de sua participação pessoal.
            Por esse motivo, Deus opera purificando o cristão (homem pecador) de toda sua imundice e idolatria, mas o crente também é conclamado a purificar a si mesmo como Cristo é puro e limpar-se de toda imundice da carne e do espírito, aperfeiçoando sua santidade no temor de Deus (Ezequiel 36:25; 2 Coríntios 7:1).
            11:2  O Meio Cristão para a Pureza. Como Deus opera em nós, temos a segurança de que nossa luta não será em vão. Não temos desculpas para a passividade, mas toda razão para uma busca zelosa por pureza.
            Gostaria de mencionar nesta parte, quatro dos meios  mais proeminentes de Deus para o crente se purificar. Primeiro, a pureza começa com a separação do pecado. É impossível a purificação se primeiro não tivermos nos afastado daquilo que nos contamina. Pouco adianta nos esfregar com sabão se primeiro não sairmos do chuveiro da imundícia. Por esta razão, o apóstolo Paulo exortou os crentes de Corintos: “(...), retirai-vos do meio deles, separai-vos, diz o Senhor; não toqueis em coisas impuras, e eu vos recebei” (2 Coríntios 6:17).
            Segundo, Deus nos deu as Escrituras como disciplina fundamental para uma vida de piedade. De acordo com o salmista, o jovem guarde puro o seu caminho somente ao atender a Palavra de Deus, guardando-a em seu coração, para não pecar contra Deus (Salmo 119:9,11). O apóstolo Pedro no contexto da sua exortação quanto a santidade, encoraja os crentes a desejar o leite puro da Palavra, para que por ele crescessem quanto a salvação (1 Pedro 2:2).
            Terceiro, um meio poderoso, mas muito negligenciado, de purificação é a disciplina da oração. O Senhor nos ordenou a orar para que fossemos levados a tentação, mas libertos do mal. No jardim do Getsêmani, na noite em que foi traído, Jesus deu uma ordem similar a seu círculo mais intimo de discípulos: “Orai, para que não entreis em tentação” (Mateus 6:13; Lucas 22:40). Em sua Carta a igreja de Éfeso, Paulo, após tratar da questão da batalha espiritual, exorta os crentes a orar em todo o tempo, com toda oração e se manterem alertas (vigilantes), com toda perseverança e pedidos por todos os santos (Efésios 6:18).
            Quarto, as Escrituras ensinam que o crente cresce em pureza e santidade no grau em que obtém vislumbres cada vez maiores de Cristo e de seu Evangelho. (...). Nada purifica mais do que conhecer uma pessoa realmente piedosa ou como Cristo. Quanto mais tempo passamos na presença de uma pessoa assim, e quanto mais intima nossa comunhão, maior o efeito exercido sobre nossa vida.
            Por esta razão, o apóstolo Paulo escreve: “E todos nós, com o rosto desvendado, contemplando, como por espelho, a glória do Senhor, somos transformados, de glória em glória, na sua própria imagem, como pelo Senhor, o Espírito” (2 Coríntios 3:18).
            11:3  Pureza como Evidência de Conversão.  O final do texto de João é poderoso e carregado de verdade: “E a si mesmo se purifica todo o que nele tem esta esperança, assim como ele é puro”. A primeira coisa que devemos destacar deste versículo é a referência dada a expressão “todo”, como incluindo todos que acreditam verdadeiramente no Senhor Jesus Cristo para a salvação. O propósito do autor é claro: Todo verdadeiro cristão será marcado por um esforço pessoal e prático por santidade.
            Um ranking de três tipos de indivíduos que estão dentro da comunidade evangélica tem existido por muito tempo: o descrente, o cristão carnal e o cristão espiritual. Conquanto seja verdade que os cristãos ainda lutem contra o pecado, e até mesmo o mais forte entre os santos tenha de batalhar contra a ameaça sempre presente da apatia, não existe base para o que hoje se chama popularmente de cristão carnal.
            Não existe cristão que vive em contínuo estado de carnalidade, não existe cristão em que Deus não esteja operando efetivamente. As Escrituras testificam que Deus está operando na vida de todo crente sem exceção, tanto o querer quanto o efetuar (realizar), para seu bom prazer. O Deus que comandou os homens para que criassem seus filhos no temor e na admoestação do Senhor, poderia ter abandonado seus próprios filhos num estado de negligência? Requereria  ele presbíteros que governassem bem as próprias casas enquanto a sua casa está em desordem? (Filipenses 2:13; Salmos 115:3; 135:6; Efésios 1:11).
            Deus é implacável no cuidado e disciplina de seus filhos. O fato de que muitas pessoas dentro da comunidade evangélica se degeneram não é uma negação das promessas de Deus, mas prova da ilegitimidade deles. O fato aterrador é que simplesmente não são seus filhos. Se o fossem, Hebreus nos diz, Deus os castigaria e eles permaneceriam (Hebreus 12:6-8). Portanto, o crente que verdadeiramente fixou sua esperança sobre Cristo para a salvação se purifica, assim como Cristo é puro e, aquele que adotou o Cristão como filho, toma grande cuidado para conformá-lo à sua vontade.
            11:4  Encorajamento para os Cristãos. Não foram chamados para embarcar sozinhos numa jornada com fim incerto. Embora João nos fale que não sabemos ao certo como seremos quando a obra de Deus estiver completa em nós, sabemos que seremos como ele. O final do crente é tão ilustre que temos de dizer que nem olhos viram nem ouvidos ouviram, nem entrou no coração do mais entendido entre os homens tudo que Deus tem preparado para aqueles que o amam (1 João 3:2; 1 Coríntios 2:9).
            A grande esperança firmada sobre o decreto divino e confirmada pelo sangue do Calvário, enche o crente com “alegria indizível e cheia de glória” e o conduz a pureza, ao desejo de “Ser Santo, porque eu sou santo” (1 Pedro 1:7-8,16).

Cap. 12 Praticar a Justiça.

1 João 2:28-29. Filhinhos, agora, pois, permanecei nele, para que, quando ele se manifestar, tenhamos confiança e dele não nos afastemos envergonhados na sua vinda. Se sabeis que ele é justo, reconhecei também que todo aquele que pratica a justiça é nascido dele.
(...)
1 João 3:4-10. Todo aquele que pratica o pecado também transgride a lei, porque o pecado é a transgressão da lei. Sabeis também que ele se manifestou para tirar os pecados, e nele não existe pecado. Todo aquele que permanece nele não vive pecando; todo aquele que vive pecando não o viu, nem o conheceu. Filhinhos, não vos deixeis enganar por ninguém; aquele que pratica a justiça é justo, assim como ele é justo. Aquele que pratica o pecado procede do diabo, porque o diabo vive pecando desde o principio. Para isto se manifestou o Filho de Deus: para destruir as obras do diabo. Todo aquele que é nascido de Deus não vive na prática de pecado; pois o que permanece nele é a divina semente; ora, esse não pode viver pecando, porque é nascido de Deus. Nisto são manifestos os filhos de Deus e os filhos do diabo: todo aquele que não pratica justiça não procede de Deus, nem aquele que não ama a seu irmão.
           
            Nas duas passagens acima, aprendemos que a marca do verdadeiro cristão será em conformidade com Cristo quanto a prática da justiça. As semelhanças entre as duas provas são visíveis – o crente purifica a si mesmo, assim como Cristo é puro. O cristão pratica a justiça, assim como Cristo é justo. Embora distinções possam e devam ser feitas entre santidade e justiça, uma não existe sem a outra dentro de uma mesma pessoa. Uma pessoa marcada por uma será igualmente marcada pela outra (1 João 2:29; 3:8).
            (...) a verdadeira santidade ou pureza moral não é validada por um sentimento ou por algum estado de êxtase espiritual, mas pela prática da justiça. A palavra justiça é uma tradução da palavra grega Dikaiosúne e denota o estado de alguma coisa ou de alguém que está certo diante de Deus, ou aprovado por Deus. Quando o termo é usado com respeito a justiça pessoal do crente, se refere a usa conformidade com a natureza e vontade de Deus; como é revelada em toda a Escritura e, acima de tudo, na pessoa de Jesus Cristo. João estima a Cristo como padrão máximo de pureza e justiça. Esta é uma verdade poderosa e transformadora, que permite que a moralidade e a ética do cristão sejam verdadeiramente centrados em Cristo.
            A palavra “prática” vem do verbo grego Poiéo, que quer dizer fazer, causar, realizar, desempenhar, manter ou trabalhar. Esta palavra grega denota atividade e que a justiça sobre a qual João escreve é ativa, prática e observável. Não é a justiça daqueles que meramente são ouvintes da palavra, mas sim daqueles que realmente a praticam (ou cumprem). Também não é uma justiça apenas mística ou daqueles que excedem no conhecimento, mas falham na ação. Pelo contrário, é a justiça da simples obediência, observável em conformidade a lei de Deus e imitação de Cristo.
            12:1  Uma Advertência muito necessária. (...) a obediência prática e discernível é uma prova da conversão. Já encontramos essa verdade por duas vezes: 1 João 1:5-7; aprendemos que o cristão autêntico anda na luz – seu estilo de vida condiz com a revelação que Deus faz de sua pessoa e vontade. Em 1 João 2:3-5; descobrimos que aqueles que são realmente convertidos guardam os mandamentos de Deus.
            Agora em 1 João 2:29, é-nos dito que todo aquele que pratica a justiça, conforma sua vida e obras ao padrão da lei de Deus, e é verdadeiramente nascido de Deus. Esses textos se destacam com muitos outros por todo o Novo Testamento demonstrando que a salvação pela graça mediante a fé é evidenciada pelas obras (Tiago 2:14-26); que a justificação é provada pela santificação, que a justiça posicional é validada pela justiça pessoal; que a confissão feita de Cristo como Senhor é testada pela obediência prática, e que, se alguém estiver em Cristo é nova criatura, para quem as coisas antigas já passaram e todas as coisas se fizeram novas.
            A igreja cristã caminha numa estrada estreita, com ciladas mortais de ambos os lados. De um lado está o legalismo – uma religião de regras e recompensas, de exaltação do desempenho do homem e, consequentemente, de diminuição da pessoa e obra de Cristo. O homem triunfa e Deus se torna devedor, obrigado a recompensá-lo por sua piedade e nobres realizações. Do outro lado do caminho perigosamente estreito do cristianismo está a cilada do antinomianismo – doutrina que defende de que a graça livra o cristão das restrições morais da lei, resultando na prática, sem censura, da imoralidade.
            Embora seja tão mortífero como o legalismo, está mais destacada no cristianismo contemporâneo e, portanto, merece nossa atenção com maiores detalhes. O antinomianismo transforma a graça de Deus em licenciosidade[15] e se gaba de um lema terrível: “Permaneceremos no pecado, para que seja a graça mais abundante” (Romanos 3:8; 6:1). Na sua mais extrema forma é facilmente reconhecida e rejeitada, mas quando se apresenta camuflada pela capa da “Mente Aberta”, compaixão e caridade cristã, se torna enganosa e mortal.
            Temos que reconhecer que vivemos numa era de relativismo, onde os absolutos morais são negados. Este mal penetrou na igreja e o resultado são devastadores. Vivemos numa era de humanismo e individualismo, em que o homem é o centro e fim de todas as coisas, e o individuo solitário exige autonomia irrestrita de expressão, sema a mínima censura. Sendo que não há mais um padrão divino a ser conhecido e obedecido, ficam apenas as opiniões das pessoas. Vivemos ainda, em meio de um romantismo distorcido, onde a piedade foi redefinida como a mente aberta a tudo, e a tolerância é a suprema manifestação do amor. Senso assim, qualquer forma de repreensão é considerada o maior ato de imoralidade.
            Se as pessoas, a luz das Escrituras, se encontram apáticas quanto a justiça, praticante do pecado, sem remorso ou melhoria, sem lei, imorais e mundanos, deverão ser admoestados de que essas são marcas dos não convertidos. Deverão ser conclamados a “Buscar o Senhor enquanto se pode achar, invocai-o enquanto está perto” (Isaías 55:6).
            12:2  Discernir Tendências da Família. De acordo com João – e Cristo, o mundo se divide entre o Cristão, cujo parentesco espiritual vem de Deus por meio de Cristo, e o Incrédulo, que é identificado com o diabo por  meio de Adão e sua própria desobediência. Começamos a entender porque João termina esta seção da primeira Carta, com a afirmação de que existem diferenças discerníveis entre o crente e o incrédulo; que a confissão de fé da pessoa pode e deverá ser testada; que a segurança da salvação não é apenas baseada naquilo que a pessoa diz e sente, mas nas evidências práticas de uma vida transformada e transformadora.
            Neste versículo, ele afirma que as diferenças entre eles são “manifestas” ou obvias. A palavra é traduzida do adjetivo grego Phanerós, que significa aparente, manifesto, evidente, claramente reconhecido ou conhecido. (...), João resume essas evidências com surpreendente clareza: “O incrédulo pratica o pecado e não pratica a justiça e o crente pratica a justiça e não vive na prática do pecado” (João 3:7-10). De acordo com João, o descrente é destacado por duas realidades ominosas[16]: o que faz e o que não faz.
            Embora tais características sejam mencionadas separadamente, elas basicamente se referem a mesma coisa: desobediência, errar o alvo da vontade de Deus (pecar) ou desviar-se do seu padrão. Não podemos nos enganar, pensando que apatia diante da piedade e negligência da lei de Deus sejam crimes menores do que rebeldia aberta. De acordo com 1 João 3:4, todo pecado é ilegalidade, é um ato de traição para com Deus e declaração de guerra contra o seu trono.
            Os que se identificam com Cristo, mas exibem contínuo desinteresse por sua Palavra estão em perigo tão grande quanto aqueles que vivem desafiando a Deus abertamente, sacudindo o punho cerrado na cara do Senhor. No Sermão do Monte, Cristo faz severa admoestação contra aqueles que professavam ser seus discípulos: “Eu lhes disse explicitamente: Nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os que praticais a iniquidade” (Mateus 7:23).
            Cristo emprega a mesma palavra usada por João – iniquidade. Como João, ele está dizendo que aqueles que chamam ao Senhor, mas continuam vivendo uma lei para si mesmo serão condenados no dia do juízo. O apóstolo Paulo confirma esta verdade em sua Carta a Tito: “Porquanto a graça de Deus se manifestou salvadora a todos os homens, educando-nos para que, renegadas a impiedade e as paixões mundanas, vivamos, no presente século, sensata, justa e piedosamente”.
            Dentro da comunidade evangélica, poucos parecem ainda ordenar suas vidas de modo com os ditames da Escritura, e qualquer menção da moralidade certa e especificamente definida pelas Escrituras e imediatamente rotulada de legalista. Igualmente ao incrédulo, o Cristão autêntico também se distingue por duas realidades: o que faz e o que não faz. Porém, é aqui que as semelhanças entre eles terminam, e é aqui onde começa o grande contraste, pois o cristão pratica a justiça que é desprezada pelo descrente,  e despreza o pecado que o incrédulo continua praticando (ou tanto ama).
            Para João, a razão desse grande contraste no comportamento está muito clara: “aqueles que foram genuinamente convertidos não podem se entregar a pratica habitual do pecado, porque nasceram de Deus e a semente divina habita nela”.  A referência de João a divina semente e ao novo nascimento tem a intenção de enfatizar que a conversão é obra sobrenatural de Deus, e que o cristão é uma nova criatura, com nova natureza refeita a semelhança de Deus, em justiça e santidade.  Como escreve o apóstolo Paulo, o cristão tornou-se participante da natureza divina e objeto do poder divino, resultado tanto na vida quanto na piedade (1 João 3:9; 2 Coríntios 5:17; Efésios 4:24; 2 Pedro 1:3-4).
            Não significa que um crente não tenha pecado e que seja imune a tentação, ou ainda, que esteja livre das lutas contra a carne. Mas sim que, a pessoa regenerada pelo Espírito de Deus não pode viver na prática habitual do pecado, assim como um peixe não pode viver muito tempo fora da água; não podemos e nem devemos viver enganados, pois João nos diz de forma muito simples: “Aquele que pratica a justiça é justo, assim como ele é justo; aquele que pratica o pecado procede do diabo, porque o diabo vive pecando desde o principio” (1 João 3:7,10).

Cap. 13  Vencer o Mundo.

1 João 5:4-5. Porque todo o que é nascido de Deus vence o mundo; e esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé. Quem é o que vence o mundo, senão aquele que crê ser Jesus o Filho de Deus.
(...)
1 João 4:4-6. Filhinhos, vós sois de Deus e tendes vencido os falsos profetas, porque maior é aquele que está em vós do que aquele que está no mundo. Eles procedem do  mundo; por essa razão, falam da parte do mundo, e o mundo os ouve. Nós somos de Deus, aquele que conhece a Deus nos ouve; aquele que não é da parte de Deus não nos ouve. Nisto reconhecemos o espírito da verdade e o espírito do erro.
            O crente não é vitorioso por sua força de vontade ou devoção pessoal, mas por aquilo que foi feito por Cristo na cruz, que está sendo realizado nele pelo Espírito e pelas fiéis obras da providência de Deus Pai. Pela obra regeneradora do Espírito Santo, nascemos de novo e somos fortalecidos para andar em novidade de vida, de forma que é quebrado o poder do pecado. E, agora, “(...), nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus” (Romanos 8:1).
            No ensino do Novo Testamento o filho de Deus enfrenta muitas lutas por dentro e por fora.  Às vezes é vencido e fica até mesmo atordoado. Porém, (...). Ainda que caia sete vezes, ele se levanta cada vez.  Embora ande por muitos vales escuros, a sua peregrinação o leva a alturas cada vez maiores. Embora passe por derrotas, o cristão não é derrotado no final. Essa é a natureza da salvação, pois o Deus que começou a boa obra há de completa-la.
(...), aprendemos que uma das grandes marcas da verdadeira conversão é que o mundo não vence o cristão a ponto de ele negar a Cristo e voltar para o mundo. Sabemos que conhecemos a Deus e somos realmente nascidos de novo porque, através de inúmeras batalhas que rugem por dentro e por fora e frequentes falhas e quedas, Deus nos sustém e continua a trabalhar em nós para nosso bem e sua glória.
            13:1 O Mundo versus o Cristão. O mundo representa tudo que é hostil a Deus e se firma em oposição ao Cristão, que procura andar pelo caminho estreito, conforme os mandamentos de Cristo. Como cristãos, jamais devemos nos surpreender ou abalar pela hostilidade do mundo para conosco, nem pela extensão em que ele procura impedir nosso progresso em Cristo. Paulo escreveu sobre esse assunto: “Todos quantos querem viver piedosamente em Cristo Jesus, serão perseguidos” (2 Timóteo 3:12).
            O crente e o mundo são diferentes e opostos, assim como a justiça e aa impiedade, o dia e a noite, Cristo e Belial, o Deus vivo e os ídolos mudos. Como a batalha contra o mundo nunca será resolvida, o cristão tem de esperar em Deus, olhar para Cristo e lutar o bom combate da fé. Nunca uma batalha foi travada sobre esta terra que exigisse mais força e perseverança do que a guerra diária contra o Cristão.
(...). Estamos por trás das linhas inimigas num mundo hostil, que se opõe a nossa doutrina e moral. Somos criticados severamente por nosso fanatismo religioso e encorajados a considerar os benefícios de transigência (tolerância). Somos tragados por vozes que nos tentam a negar nosso Senhor, abandonar nosso chamado e voltar á cidade de destruição (2 Coríntios 6:14-16).
13:2  A Certeza da Vitória. (...), temos de nos perguntar como podemos ter algum grau de esperança de que o cristão vencerá e não cairá. A resposta é simples: nossa esperança não está firmada sobre nossa própria força moral, devoção religiosa ou piedade pessoal, mas sobre a grandeza de nosso Salvador e na natureza da salvação que é nossa. Em 1 João 5:4-5, a vitória certa do cristão é atribuída a três importantes realidades: 1ª – Ele vence pelo novo nascimento; 2ª – Pela fé na pessoa e obra de Cristo e, 3ª – Pela grandeza daquele que nele habita. Noutras palavras, nossa vitória é certa porque é a vitória d’Ele, realizada na força de Deus, feita por seu prazer e para sua glória.
O cristão é chamado a contender, manter firmeza e lutar com a maior diligência e zelo. No entanto, quando a poeira tiver parada e todo inimigo estiver vencido, o cristão admitirá que a batalha, bem como a vitória, foi do Senhor (Romanos 8:37; 15:30; Lucas 13:24; 1 Coríntios 15:2; 1 Tessalonicenses 5:21; Hebreus 3:6; Efésios 6:12; 1 Timóteo 1:18).
De acordo com João, a primeira realidade que assegura a vitória do cristão é o novo nascimento: “Porque todo o que é nascido de Deus vence o mundo; e esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé”. A doutrina da regeneração é a magnifica obra de Deus pela qual um ser humano radicalmente depravado, que é hostil para com Deus e não consegue submeter-se a sua vontade, é transformado em nova criatura que o ama e se deleita em fazer a sua vontade e que busca a sua glória.
Para ser convertida, uma pessoa tem de possuir pelo menos algum conhecimento sobre a severidade do padrão de justiça de Deus e sobre sua falha em se conformar a este padrão. Uma pessoa não é justificada pela força combinada de fé mais obras, mas somente pela graça mediante a fé, somente. As obras do cristão não complementam nem acrescentam a obra perfeita de Cristo, mas fluem dela. Aqueles que foram justificados pela fé foram também regenerados pelo Espírito; foram feitos novas criaturas, com novos afetos, firmados sobre fazer a vontade de Deus (1 João 5:4; Romanos 5:1; 8:1).
13:3 A Questão da Vitória. O cristão vence o mundo em virtude do novo nascimento, pela fé na pessoa e obra de Cristo e pela grandeza daquele que habita nele. Precisamos estar certos de que tenhamos noção correta quanto ao meio pelo qual o cristão vence o mundo: Primeiro, não quer dizer que ele vencerá a carne de uma vez para sempre e nunca mais será perturbado por ela. A luta contra a carne ás vezes será gigantesca até na vida do crente mais maduro e santificado. Segundo, não significa que o verdadeiro crente vencerá o pecado nesta vida e conseguirá andar em curso ininterrupto de perfeição, sem pecar.
            Tiago, conhecido ente os apóstolos por sua piedade, inclui a si mesmo quando escreve: “Porque todos pecamos em muitas coisas”. E o apóstolo João é ainda mais severo: “Se dissermos que não temos pecado nenhum, a nós mesmos nos enganamos, e a verdade não está em nós” (Tiago 3:2; 1 João 1:8). A vida cristã vitoriosa é encontrada em perseverança e paciência. Vencer significa que, apesar de nossas falhas, continuamos em frente. Nossa jornada poderá ser uma série constante de dois passos a frente e um passo atrás, mas continuamos crendo, nos arrependendo e seguindo. Não podemos negar a Cristo,  assim como não podemos negar nossa própria realidade.
Estamos completamente convencidos de nossa incapacidade e temos de nos agarrar a Cristo, como o homem que está se afogando se agarra a uma corda de segurança ou um alpinista prestes a cair, se agarra a seus pítons (estaca que se fixa na rocha para sustentar o alpinista) e corda. Vencer significa que continuamos com Cristo, perseverando na fé até o final (Gálatas 5:17; Mateus 24:13; Lucas 16:16; João 6:68).

Cap. 14 Crer em Jesus.

1 João 5:9-12. Se recebemos o testemunho dos homens, o testemunho de Deus é maior; porque o testemunho de Deus é este, que de seu Filho testificou. Quem crê no Filho de Deus, em si mesmo tem o testemunho; quem a Deus não crê mentiroso o fez, porquanto não creu no testemunho que Deus de seu Filho deu. E o testemunho é este: que Deus nos deu a vida eterna; e esta vida está em seu Filho. Quem tem o filho tem a vida; quem não tem o Filho de Deus não tem a vida.

            De acordo com João, sabemos que nos tornamos filhos de Deus porque cremos nas coisas que Deus revelou sobre Jesus Cristo de Nazaré, seu filho. Tomando a palavra do apóstolo Paulo, somos marcados como cristãos porque nos gloriamos somente em Cristo e não depositamos nossa esperança na carne (Filipenses 3:3).
            14:1 Depreciação e Mau Direcionamento da Fé. Antes de entrar no texto da Carta de João, temos de confrontar duas opiniões populares mas errôneas sobre a fé salvadora: a primeira tem a ver com a natureza da fé e nossa apreciação da mesma. Em grande parte do evangelismo dos dias atuais, a fé salvadora foi reduzida a nada mais que uma concordância mental, muitas vezes superficial, com alguns princípios ou leis espirituais.          
Na mente de muitos, a fé se tornou apenas uma decisão da nossa vontade de aceitar a Cristo, através de uma oração decorada. Assim, a fé salvadora não é vista como toda uma vida olhando para Cristo ou como confiança perseverante nas promessas de Deus, mas como uma decisão feita uma vez e depois esquecida.
A segunda opinião errada quanto a fé tem a ver com sua direção ou fim principal. O evangelicalismo contemporâneo está cheio de igrejas da fé, movimentos de fé, conferências e livros a respeito da fé. Porém, essa intensa preocupação trata principalmente com a espécie de fé que obtém bênçãos temporais da parte de Deus e demonstra pouco interesse na espécie de fé que conduz a justificação eterna.
O apóstolo Pedro foi rápido em nos lembrar que o alvo de nossa fé é a salvação de nossas almas, não qualquer lucro temporal: “ O fim (resultado, efeito) da vossa fé – a salvação da vossa alma”. Portanto, o Télos do grego, ou seja, a grande finalidade de nossa fé, olha para além duma vida mortal e diz respeito ao resgate da condenação eterna de nossa alma, visando um relacionamento restaurado com Deus e a esperança futura de glória.
14:2 A Natureza da Fé. Muitos evangélicos dizem possuir uma fé que salva, mas essa fé tem pouquíssimo impacto real sobre sua vida no dia a dia. Este mal nos leva a fazer algumas perguntas importantes: o que significa crer no testemunho de Deus quanto a seu Filho? O que significa ter fé? O autor do livro de Hebreus nos diz: “Ora, a fé é a certeza de coisas que se esperam, a convicção de fatos que se não veem” (Hebreus 11:1).
            De acordo com o autor,  a fé é a convicção que a pessoa possui quanto a realidade de algo por que espera, ainda que não tenha sido vista ou realizada. Esta definição nos leva a outras perguntas: uma pessoa pode ter segurança daquilo que espera e pode ser convencida daquilo que ainda não viu, somente porque Deus lhe deus testemunho disso? 
A vida de Noé ilustra claramente esta verdade, e o escritor de Hebreus cita com respeito a ele: “Pela fé, Noé, divinamente instruído acerca de acontecimentos que ainda não se viam e sendo temente a Deus, aparelhou uma arca para a salvação de usa casa (família), pela qual condenou o mundo e se tornou herdeiro da justiça que vem da fé” (Hebreus 11:17).
A vida de Abraão apresenta-nos outra ilustração de fé. Ele estava plenamente convencido que teria um filho através de sua esposa Sara, muito embora, ela estivesse com a idade muito avançada. Sua maior segurança não era fundamentada sobre qualquer outra coisa visível, pois ambos estavam muito além da idade de ter filhos. Ele esperava contra a esperança e não vacilou em incredulidade, mas estava certo de que um filho ainda seria concedido, simplesmente em razão do testemunho de Deus quanto a essa questão. Sua esperança fundamentava-se sobre o fato de que aquilo que Deus promete, ele tem o poder de realizar.
14:3 O Testemunho de Deus. Em 1 João 5:9-12, é apresentado como tema principal o testemunho de Deus quanto a seu Filho, Jesus Cristo. A palavra testemunho é traduzida do idioma grego Marturía, e é usada 113 vezes no Novo Testamento. Destas, 64 estão no livro de João. No evangelho de João, o testemunho sobre Jesus é dado por João Batista, o apostolo João, Deus-Pai e o Espírito Santo, as Escrituras, as Obras de Jesus e o próprio Jesus (João 1:6-8).
Na Primeira Epístola de João, o testemunho é dado pelo próprio João, o Espírito, a água e o sangue e, finalmente, por Deus Pai. No evangelho de João, o propósito era que todos cressem que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus e que crendo, fossem salvos. Enquanto que na Primeira Epístola, o propósito do testemunho era confirmar a verdade a respeito de Jesus Cristo e seu Evangelho, dando segurança aos cristãos verdadeiros que haviam sido abalados na fé por falso mestres!
Neste mundo, todos somos conclamados a confiar em muitas espécies de testemunho (...), acreditamos nas pessoas, apesar de tudo que sabemos sobre elas, especialmente a tendência que possuem de distorcer a verdade. Portanto, se acreditamos em homens propensos a mentir, não deveríamos crer no Deus da verdade, de quem as Escrituras testificam, que não pode mentir? (Salmo 31:5; Isaías 65:16; Tito 1:2).
Crer no menor (dos homens) e desacreditar no testemunho do maior (Deus) não é apenas irracional, como também revela uma desconfiança no caráter de Deus. Mesmo no contexto de relações meramente humanas, duvidar da palavra de alguém é tido como denegrir o seu caráter. se isso é verdade em relação aos homens, ainda mais em relação a Deus, cujo caráter está tão intimamente ligado a sua Palavra (Salmo 138:2).
Nas palavras de João neste texto: “Aquele que não dá crédito a Deus o faz mentiroso, porque não crê no testemunho que Deus dá acerca do seu Filho”. A incredulidade nunca é desculpada nem considerada de pouco caso; pelo contrário, é resultado da obstinada negação dos fatos pelos pecados, simplesmente porque se recusa a submeter-se a justiça de Deus (1 João 5:10).
14:4  O Significado da Vida Eterna. João nos diz agora sobre a natureza exata do testemunho de Deus sobre seu Filho: “E o testemunho é este: que Deus nos deu a vida eterna; e esta vida está no seu filho”.  Para entender este texto plenamente, temos de responder duas perguntas importantes: o que é vida eterna? Qual o significado e implicações da frase “em seu Filho”?  Existe muita confusão em relação a vida eterna, principalmente em relação ao tempo como também de sua natureza.
1ª - Quanto ao tempo, muitos parecem ver a vida eterna exclusivamente como uma esperança futura, considerando-a sinônima à glorificação ou a vida futura no céu. Tal entendimento contraria o ensino das Escrituras de que a vida eterna começa no momento da regeneração e continua por toda a eternidade (João 3:36). O verbo tem é traduzido do tempo presente no grego, demonstrando que a vida eterna é uma realidade presente para os que realmente creem.
Em 1 João 5:11, João declarou: “Deus nos deu a vida eterna”. A expressão “nos deu” (ou tem-nos dado) é traduzida do tempo Aoristo[17] do grego, demonstrando que a vida eterna já foi dada aos que creram no Filho. Disto concluímos que, embora a vida eterna seja uma esperança futura, é também, uma realidade presente. Começa no primeiro momento de fé em Cristo, e nunca acabará pelas incontáveis eras da eternidade.
2ª – Quanto a natureza, ela se refere a qualidade de vida, ou seja, embora a vida eterna nunca acabe, a grande ênfase está sobre a nova espécie de vida que o cristão recebeu de Cristo (tem-nos dado). No discurso no Cenáculo, o Senhor Jesus Cristo descreve a vida eterna da seguinte maneira: “E a vida eterna é esta: que te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste”. Neste texto, Jesus não está considerando a vida eterna como uma quantia de tempo, mas como uma qualidade de vida em comunhão com Deus e com seu Filho.
A palavra “conhecer” é traduzida do verbo grego ginósko, sendo frequentemente usado para transmitir a ideia hebraica de conhecimento dentro do contexto de um relacionamento pessoal. Muitas vezes, nas Escrituras, ela é usada para descrever a “intimidade pessoal e até física (sexual)” entre um homem e uma mulher. Neste texto de João, é empregada para descrever a vida eterna como sendo “uma vida de intima comunhão com Deus”.
João confirma esse entendimento do texto através de seus comentários finais de sua Primeira Epístola: “Também sabemos que o Filho de Deus é vindo e nos tem dado entendimento para reconhecermos o verdadeiro, e estarmos no verdadeiro, em seu Filho, Jesus Cristo. Este é o verdadeiro Deus e a vida eterna” (1 João 5:20).
A ordem lógica é como se segue: mediante a pregação do evangelho e a obra regeneradora e iluminadora do Espírito que habita em nós, Deus dá vida, entendimento e coração disposto a seu povo. O resultado é que entram em nova vida de fé, comunhão, louvor e serviço a Deus. Isto é vida eterna – não apenas um alongamento de dias ou esperança futura no céu, mas uma nova vida em Cristo Jesus.
14:5  Vida no Filho. Passamos agora a inexorável verdade de que esta vida está “em seu Filho”. Essas três palavras são traduzidas da frase grega “en to huio” e revelam uma das mais belas verdades de toda Escritura. No grego, a preposição ajuda a entender que o substantivo está num caso que indica a esfera em que se encontra a vida eterna. Ela se encontra exclusivamente no Filho! Isto é a prova de que Jesus não é meramente tudo de que necessitamos, mas também é tudo que temos!
Sem ele não temos parte com Deus. Nele, possuímos toda benção de Deus ao homem. Fora dele nada temos e nada somos. Somente Cristo é o fundamento sobre o qual se constrói qualquer coisa que possa ser edificada. Ente as verdades maiores, mais fundamentais do cristianismo encontramos esta: “a vida eterna e todas as demais bênçãos espirituais estão exclusivamente no Filho”. Jesus testificou de si mesmo: “Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida, ninguém vem ao Pai senão por mim” (1 João 3:11; João 14:6).
A verdade de que a vida eterna está exclusivamente no Filho não pode ser descartada. De fato, o cristianismo é encontrado em seu estado mais puro quando reconhece que, sem o Filho, somos “separados da comunidade de Israel e estranhos as alianças da promessa, não tendo esperança e sem Deus no mundo”.
No Filho, somos abençoados com toda benção espiritual. No Filho, fomos escolhidos antes da fundação do mundo. No Filho, Deus concede livremente sua graça sobre nós. No Filho, temos a redenção e o perdão das transgressões. No Filho, Deus tornou conhecido a nós os mistérios da sua vontade. No Filho, Deus uniu todas as coisas no céu e na terra. No Filho, fomos selados pelo Espírito Santo da promessa.  Por esta razão é que João conclui com uma das mais poderosas declarações das Escrituras com respeito á singularidade, supremacia centralidade de Cristo na salvação: “Aquele que tem o Filho tem a vida; aquele que não tem o Filho de Deus não tem a vida” (Atos 4:12; 1 Timóteo 2:5; Efésios 2:12; 1 João 5:12).
14:6 O Testemunho Interno. De acordo com o apóstolo João, o testemunho de Deus é este: “Deus nos deu a vida eterna, e esta vida está em seu Filho”. Além do mais, ele declara que todos aqueles que realmente creem no Filho tem em si mesmo esse testemunho. Esta verdade é muito mais difícil de interpretar do que poderíamos achar. Mesmo entre estudiosos dentro da tradição conservadora e reformada, vários pontos de vista têm sido expostos:
 A primeira marca de que fomos verdadeiramente convertidos é que aceitamos o testemunho de Deus, que foi primeiramente comunicado através de testemunhas oculares como os apóstolos, e desde então, tem sido transmitido a cada sucessiva geração pela fiel pregação do evangelho.
A segunda marca de que somos verdadeiramente cristãos está no testemunho  interno do Espírito que habita em nós. Do evangelho de João, aprendemos que o Espírito Santo foi enviado para testificar de Cristo, habitar o crente e conduzi-lo a toda verdade. Sabemos que somos filhos de Deus e temos um relacionamento constante com Cristo pelo Espírito, que ele nos deu. O Espírito de Deus testifica a encarnação e obra expiatória de Cristo e confirma sua realidade dentro de nosso coração (João 14:6; 15:26; 1 João 3:24; 4:2,13).
O Espírito Santo remove o temor escravizador da condenação e o substitui por forte segurança de filiação por meio do qual clamamos “Aba, Pai”. Finalmente, o Espírito Santo dá testemunho de que somos filhos de Deus mediante seu trabalho continuo de santificação, conformando-nos á imagem de Cristo e produzindo a vida frutífera de Cristo em nós (Romanos 8:16; Gálatas 5:22-23).
A terceira marca de que verdadeiramente cremos para a salvação é o testemunho de realidade da vida eterna em nosso interior. Sabemos que cremos para a salvação porque estamos em comunhão real, vital e permanente com o único Deus verdadeiro e Jesus Cristo a quem ele enviou: “esta é a vida eterna!  Isto é verdade em nós” (João 17:3; 1 João 5:20).

Portanto, amados irmãos e leitores, poderíamos resumir o ensino contido nesta primeira parte,  da seguinte forma:

Prova 1: Sabemos que somos cristãos porque andamos na luz. Nosso estilo de vida está aos poucos se conformando ao que Deus nos revelou sobre sua natureza e vontade (1 João 1:4-7);

Prova 2: Sabemos que somos cristãos porque nossa vida é marcada por sensibilidade ao pecado, arrependimento e confissão (1 João 1:8-10);

Prova 3: Sabemos que somos cristãos porque guardamos os mandamentos de Deus. Desejamos conhecer a vontade de Deus, nos esforçamos por obedecê-la e lamentamos quando somos desobedientes (1 João 2:3-4);

Prova 4: Sabemos que somos cristãos porque andamos conforme Cristo andou. Desejamos imitar a Cristo e crescer em conformidade a ele (1 João 2:5-6);

Prova 5: Sabemos que somos cristãos porque amamos os outros cristãos, desejamos comunhão  com eles e procuramos servi-los em atos e em verdade (1 João 2:7-11);

Prova 6: Sabemos que somos cristãos porque temos desdém cada vez maior pelo mundo e sujeitamos tudo que contradiz e se opõe a natureza e vontade de Deus (1 João 2:15-17);

Prova 7: Sabemos que somos cristãos porque continuamos nas doutrinas históricas e práticas da fé cristã, permanecendo dentro da comunhão com outros que fazem o mesmo (1 João 2:18-19);

Prova 8: Sabemos que somos cristãos porque professamos que Cristo é Deus e O consideramos em mais alta estima (1 João 2:22-24; 4:1-3);

Prova 9: Sabemos que somos cristãos porque nossa vida é marcada por anseio e busca prática de santidade pessoal (1 João 3:1-3);

Prova 10: Sabemos que somos cristãos porque praticamos a justiça. Fazemos as coisas que se conformam ao padrão da justiça de Deus (1 João 2:28-29);

Prova 11: Sabemos que somos cristãos porque vencemos o mundo. Embora muitas vezes sejamos pressionados e cansados, vamos em frente pela fé. Continuamos seguindo a Cristo e não voltamos para trás (1 João 4:4-6; 5:4-5);

Prova 12: Sabemos que somos cristãos porque cremos naquilo que Deus revelou sobre seu Filho, Jesus Cristo. Temos a vida eterna somente n’Ele (1 João 5:9-12).

            Se temos essas qualidades e admitimos que elas estão aumentando em nós, temos a evidência de que conhecemos a Deus e produzimos o fruto de um Filho de Deus. Porém, se tais qualidades estão ausentes em nossa vida, devemos nos preocupar grandemente por nossas almas.
            Temos de ser diligentes em buscar a Deus com respeito a nossa salvação. Temos de examinar-nos novamente para ver se estamos na fé. Sermos diligentes para tornar seguro nosso chamado a nossa eleição (2 Coríntios 13:5; 2 Pedro 1:8-11).



[1] Textos: Atos 2:23; Hebreus 1:3; Filipenses 2:6-7; Lucas 1:35.
[2] Textos: Marcos 1:15; Romanos 10:9; Filipenses 3:3.
[3] Admoestar. Censurar; 2. Repreender; 3. Advertir ou avisar alguém de forma branda sobre alguma coisa.
[4] A submissão ao senhorio de Jesus é sinônimo de produzir fruto (Mateus 7:6,26), obediência à vontade de Jesus (Mateus 7:21) e obras (Tiago 2:14-26).
[5] Os Israelitas demonstravam caridade ao deixar uma parte da colheita no campo (Levítico 19:9-10); emprestando sem usura (juros excessivos – Êxodo 22:25); abrindo a mão aos pobres (Deuteronômio 15:7); defendendo os órfãos e intercedendo a favor das viúvas (Isaías 1:17).
[6] Como por exemplo, quando o desejo é dirigido a algo que é proibido ou, ainda, mesmo sendo permissível, se sua intensidade for igual ou maior do que o desejo da pessoa para com Deus.
[7] Epítome. O que resume, simboliza ou serve de modelo ideal de. 2. Resumo de teoria, ciência, doutrina etc.
[8] A expressão “já é a última hora” é sinônima de os “últimos dias”, referindo-se à época entre a ressurreição e exaltação de Cristo e sua segunda vinda (Atos 2:17; 2 Timóteo 3:1; Tiago 5:3).
[9] Sobre esta Doutrina, sugiro que o leitor vá ao Capítulo 17 das Confissões de  Fé de Westminster e de Londres de 1689, onde está exposta de maneira extensa sobre a mesma.
[10] A expressão “é nascida de Deus” é a tradução do verbo gegénnetai do grego, que está no tempo perfeito e voz passiva. Sua tradução correta “[Todos que creem que Jesus é o Cristo nasceram de Deus]”. Portanto, a obra da regeneração logicamente precede a fé e é causa e fundamento da mesma.
[11] Agnósticos. É aquele que considera os fenômenos sobrenaturais inacessíveis à compreensão humana. A palavra deriva do termo grego “agnostos” que significa “desconhecido", "não cognoscível”. 2. Eles consideram inútil discutir temas metafísicos, pois são realidades não atingíveis através do conhecimento. (...), a razão humana não possui capacidade de fundamentar racionalmente a existência de Deus.

[12] Ascético. Que ou aquele que se volta para a vida espiritual, mística; contemplativo. 2. Doutrina filosófica que defende a abstenção dos prazeres físicos e psicológicos, acreditando ser o caminho para atingir a perfeição e equilíbrio moral e espiritual.

[13] Docetismo. A palavra é derivada do vergo “Dokéo” que significa “parecer ou ter aparência”. Os gnósticos acreditavam na maldade inerente do corpo material, por isso era necessário que negassem a encarnação e ensinassem que o Cristo divino “parecia ou tinha aparência” de possuir um corpo.
[14] As Escrituras ensinam que Deus criou o mundo do nada (Hebreus 11:3). Ele não emprestou a matéria de alguma outra fonte para formar o mundo. Pelo contrário, ele falou e a matéria passou a existir.
[15] Licenciosidade. É traduzida da palavra grega asélgeia, que denota a luxúria desenfreada, excesso, libertinagem, sensualidade, impudência e insolência.
[16] Ominosa. Que pode expressar ou trazer mau agouro; 2. Que tende a ser detestável ou execrável. 3. Que incita ódio.
[17] Aoristo. Forma aspectual (pontual) e temporal do verbo grego antigo, que expressava a ação pura, sem determinação quanto à duração do processo ou ação ou ao seu acabamento.

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